Mergulho no ar noturno, soturno, talvez até com netúnio, gás
nobre porém artificial. Gelado, privando qualquer acalento soberbo das
flores e sebes da primavera.
Pode-se ser si mesma quando só. É isso que se precisa fazer com
frequência: pensar, não exatamente, também contemplar, ficar
em silêncio
A existência toda, as atividades, com o que possuem de expansivo, vibrante,
contagiante, vozes, gestos humanos esvanecem-se. Então, torna-se possível
certa solenidade, retrair-se em si, no cerne pontiagudo das trevas, algo invisível
para os outros seres.
Deste modo sente-se o ser autístico patético socialmente, depois
de se livrar dos laços, pronto para as excêntricas viagens, aventuras,
sonhos, a realidade inventada, considerada pelas pessoas talvez como uma "desrealidade"
ou excesso de imaginação faiscado de símbolos intangíveis
pela linguagem da razão.
Quando o ritmo da vida diminui por um instante, a amplitude do âmago das
experiências torna-se infinita. Todos possuem esse sentido de possibilidades
imprevisíveis e ilimitadas.
Sente-se, então, que as aparências, os aspectos que caracterizam
cada identidade são simplesmente infantis (de infanto - não fala
- inefável) e fundem-se à energia cósmica do Todo. Tudo
negro, amplo e incomensuravelmente profundo; contudo horizonte ilimitado, diversos
lugares a que não se foi, como planícies da Índia abrem-se
sob uma pesada cortina de couro de uma igreja romana. Esse cerne das trevas
pode ir a qualquer lugar, pois ninguém o vê. Não se pode
deter, enquanto no pensamento incutido.
A liberdade, a paz e - o mais agradável - o poder de recuperação,
descanso numa plataforma de estabilidade sobre o solo da concretude, tudo isso
lá enleados estão. Mas não como indivíduo que encontra
esse repouso, ensina a experiência. Somente como recantos, lampejos de
sobra...