A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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Angústia - uma vivência

(Tania Montandon)

Tristeza aguda, medo de viver, culpa do errado, sem saber o que fazer. Tantas perguntas no ar, vivências inesperadas, relatos fantásticos em ambos os sentidos. Até onde é Natureza, destino ou escolha? Até onde acreditar, confiar, doar?

Quando o ar atingiu-me, senti um grande empuxo para fora do mundo, uma sensação ominosa de não pertencer a tal lugar. Segredos do espírito, o que o faria me contar?
Coração ferido, vulnerável,à flor da pele. Dor crônica, pretendente a característica personal. Aguça a sensitividade, alastra o medo, sobrenatural. Expia sem se ver, participa do viver, constrói artifícios até morrer.

Natural beleza, Natureza, nascente tristeza por grande vileza. Sólida irmã da vida, assiste a seus verdes, rios, distraída; caírem por terra, na cobiça e na serra, a Mãe destruída.

À surdina, um toque de leve oferta-lhe traços. Formas que adereçam a esperança última do socorro. Luta contra a descrença, envolve-se de corpo. E o nariz, ponto primeiro do contato, é estraçalhado ante o escárnio, em princípio, mal ditoso. Arrivista maquiavélica bem adjetivam tal vil dita. Sobriedade atenta é fuzilada e envenenada, grande destreza a da serpente.

Insegurança, artimanhas que faltam ao bom espírito; tão jovem e também desprovido da caliente intrepidez que lhe é típica. As duras provisões da realidade sobressaltaram precocemente qualquer impulso insensato de ato heróico ou sublimado, extinguindo-os.

Manchada a vinha de alecrim, inexorável penha surgindo a sudeste da arrebatada vista, o ar claro e puro penetrando as narinas e acariciando a macia pele.. Bendizer sua criação até poderia, não fosse os restos de dor magoada, ressentida, orgulhosa escamoteando o divino deleito do dia.

Perdida nas largas mangas da confortroupa, com a seca meleca vigiando o vestíbulo nasal e os extremos das arcadas superiores e inferiores pesando a gravidade sob princípios de tal lei, assim como denotando sincero desprezo à esperança. Assim encontra-se dito ser feminil entre as vagas forças intermitentes para o trabalhárduo do chomp chicle bola poft...

Devaneleiando-se às quimeras mais reais, tomando distância das sensações materiais e regozijando-se então da tersa posição de derrisão, escarninho das tragédias fatais. Com o espírito desvinculado ao corpo carnal, assiste aos próprios desesperos e se espanta com o alvoroço por tão mundanas perecíveis futilezas.

Enleiando-se no processo com intrepidez e certa dose daquele gozo sofredor inato do qual ainda não conseguiu desemaranhar-se, engolindo raivas, mágoas, hostilidades, digerindo-as e, ao final dejetando-os; sente o peso e a aspereza daquelas ripas perpendiculares que lhe marcarão o corpo, a morte, a existência, a imortalidade da meta última.

Desgosto inquietante estiolando o mínimo orgulho que motiva tal criatura a inspirar cada molécula de ar. Irrevogável energia despendida no auto trucidamento desanimador, auto-compaixão comparável à estupidez maior.

Inapreensível certeza mórbida de energia desenlaçada, entrecortada por jatos populares proporcionando fincadas dolentes de pressão desmedida em pontos hipersensíveis.

Desesperança pesando desproporcionalmente sobre as costas de uma vida que se viu enjeitada, sufocada, desambientalizada no espaço menor, viés do acaso malquisto, tempo doído do curso vivido.

Descaso cabal do mínimo esteio que ainda enxergava. Fantasia explode do quero a morte, minha sorte! Células imperfeitas, espírito excêntrico repugnante afugenta belas expectativas divinas. Deus errou, humano existe que não concorda, dispensa tudo pois não tem mais como dar corda. Conta pesada a do lutar, cada vez mais está menos a compensar. Projetos de auto-extermínio entram em ação - falta de opção.

Chaves da cognição superior, para-além do si que se conhece, chama em canto ao Redentor, chamas de dizeres, prolixos sermões a bem da persuasão. Esta incrustada na alma vitimosa, incutida sob o abrigo do enganado responsável, alienado alienante, da verdade do ser, da verdade mentira, pois impossível de ser inscrita, muito menos escrita.

Indizível do sentir, amparo ao léu, folga do céu, recreio do "Goze!" imperativo, ativo do desatino, que brilha com glória na sociedade do festivo. Fustiga a paz da pretensa ingenuidade, embuste de qualidade que permeia o tentar ser, continuar.

Orvalho cinzento jamais visto angustia tal tronco juvenil, metralhando o ardil covardemente na proporção da desvantagem maior, pois é não visto mas sentido, negativo do explícito. De resultado é o vômito asqueroso dos dejetos orgânicos repugnados, malcheirando as belas vestes da donzela. Incongruência, realidade pasma de tal imaginário. Referências, reticências...

Cadáver ambulante movido a ciscos de energia prânica, erros de cálculo da extinção, provocando balbúrdia no organismo, bem colocado pelo sentido pejorativo do sufixo ismo , naturalismo, extintismo diria eu. Sensação exorbitante da impotência da célula vibrante nos picos e cantos da carne murchante. Degeneração de corrosão sem anestésico, sente a dor, o peso e o tédio da questão que evolui com terror e usufrui do gozo excesso. Qualquer forma é dialética, na pena, na boca ou na lepra. Fica quieta, moleca!

Pupila Joyce corrompida pela linguagem, lingüística. Real nem sei saber, mas sinto ainda crescer, mantos de algo não sei o quê. Todo ser possui seus ídolos, para crescer, mover, fazer produzir, nem que seja só para si. E assim seja, Senhor, doutor da minha alma, da minha pirraça, da minha graça. Ó quem me vir amadurecer. Grande prêmio irá merecer. Viver, sofrer, morrer. Por que o tal do amor não entra no meio?deve ser algo que interveio. O qual? Ajuda peço afinal.

Esqueleto de asas transforma os contos em pandemônios, carniça fresca do sabor das jovens mortes anunciando o Juízo Final, que, na verdade, não há Final, quando dele não se consegue separar desde o início. Só o que há, então, é final, é dor, é perda, é carniça, é resto final de um começo que não houve. Brincando com palavras, ser vil que nunca se viu tal qual, mas sempre iludido, como se assim não fosse com todos. Estágio do espelho que se foi e não deixou lembranças ao que ficou, ao final de seu começo que não lembrou.

Desprezível ser no cume de seu egoísmo particular, subjugando e menosprezando atitudes humanamente modestas e dispostas cooperativas. Grande tempestade egocêntrica e feiosa atacando friamente o humilde copo d'água descartável, cujo material nem dura o mais remoto júbilo.

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