Que eu me lembre, esta é a primeira vez que escrevo enquanto estou com
febre. Dói-me o corpo e eu tenho calafrios, indícios de uma gripe
das bravas. Que belo feriado de Páscoa! Mas o que eu posso fazer, além
de tomar remédio e descansar? Essas são daquelas coisas inesperadas,
e sobre as quais o controle é impossível ou tardio: igual ao amor
antigo, e nem sei porque eu penso nisso. Pior, por que eu escrevo entre cobertores
e chás ferventes se eu sei que depois, ao computador, mudarei tanto o
texto que parecerá um outro de idéia contrária? Nada mais
justo, repenso, pois se a páscoa é a renovação,
o que um amor antigo faz aqui, entre o peso dos cobertores?
Por certo eu corrigirei, dizendo que o amor antigo nada mais é do que
uma nuvem de cinzas, ao vento. Por ora, digo que ele é um castelo, bem
ao estilo daqueles que não se constroem mais, e a sua lembrança,
a água do fosso onde podemos nos afogar. Há que se saber nadar.
A ponte? Ao tempo o que é do tempo, que amor antigo dói mais do
que dor de gripe; ou porque foi bom ou porque não foi. Instiga como uma
luz vestida de sombras. Pode-se apenas sabê-la, como num sonho quando
se acorda.
Amor antigo... eu tenho é medo de amor antigo!
Talvez a minha avó, se lesse isso, dissesse complacentemente: - Ela
estava "tresvariando", sabe como são as coisas da febre.
Talvez. Talvez. Talvez. - Talvez eu nem saiba nadar... e talvez eu esteja amando.
Talvez eu já tenha mudado o texto.
Sei lá.
O chá vai bem mas a febre, eu nunca soube o que fazer com as coisas inesperadas.
(16.04.06)