Tudo ia tão bem: plena aceitação, nenhum problema, muita
compreensão. Sonhos e planos na gostosa direção da felicidade.
Nenhum empecilho, nem mesmo a diferença no tempo.
Aí o engano: no desejo e na entrega, idade não contava e ainda
não conta. E nos esquecemos dos planos e sonhos da vida real: nossas
expectativas, a espera e a pressa que do tempo dependem. Na gostosa direção
da felicidade, você tem uma vida à sua espera... uma vida que eu
não tenho.
A sua juventude sonha com vitórias e por elas busca e luta, sem pressa,
no tempo de hoje para o tempo futuro. O trabalho insano é o instrumento
que você vê para conseguir e você o usa sem medida. A ação
não dá o tempo da reflexão. Nada mais justo, segundo você...
Eu já não tenho perspectiva de amanhã, não existe
mais trabalho que valha a pena, a realidade é: sentada em minha cadeira,
calada, sozinha, olhando o vazio, com todo o tempo do mundo para refletir. A
única pressa que eu tenho é de amar, de receber amor, de me entregar
inteira, realizando o HOJE que não tem futuro. O meu instrumento é
o estar junto, falar e ouvir, conhecer você e a você me mostrar,
o que exige um tempo que você não tem.
E somente muito tarde acordamos para o enorme desencontro: a minha ansiedade
que tem pressa e a sua calma - ou acomodação? - que tem muito
tempo. E, incompatíveis, cada um vai para seu canto dizendo "eu
te amo"... a pior maneira de se desfazer um encontro de amor!
Ao final, a diferença em dobro: você fica com a chance de realização
de vida como escolheu; eu jogo fora o meu mais lindo sonho - o de fazê-lo
herdeiro não do que tenho, mas do que sou e do que aprendi vivendo.
Ambos sofremos, ambos somos verdadeiros, e ninguém tem culpa... Mas
o preço é o mais alto: o amor que soubemos viver, também
sem medida.