Tia Nina é uma boa mulher. Hoje bem velha. Uma dessas mulheres sorridentes,
mansas e acolhedoras que a gente conhece velhas e não consegue imaginar
que um dia tenham sido moças. Mora numa casa antiga, pobre e simples:
sala, cozinha, dois quartos. Nunca se casou. Trabalhou a vida toda lavando roupas
para as mulheres da zona do meretrício. Graças a isso, conhece
mais o assunto que qualquer prostituta em pleno exercício da profissão.
E como respeita essa profissão! Sempre diz: "De fácil essa
vida não tem nada..." E sorri docemente.
Nunca ia ao meretrício, mas sempre sabia notícias pelo sobrinho,
garoto esperto e matreiro que ia e vinha trazendo a roupa usada e devolvendo-a
limpinha. Gostava de dar uns dedinhos de prosa com as moças e acabava
sabendo de tudo que acontecia por lá. Certo dia chegou contando que uma
das mulheres engravidara e não aceitava fazer um aborto. Mas também
não sabia como criar um bebê naquele lugar. Tia Nina correu lá,
procurou pela futura mamãe, oferecendo-se para cuidar de seu bebê.
E assim o fez.
Ela e Dora - a mãe - evidentemente ficaram muito amigas. Serginho, o
bebê, nasceu forte, bonito e com sorte: tinha duas mães. Hoje,
homem feito, não sabe a qual mãe ama mais.
Dora era uma mulher tímida, cumpridora de seus deveres, excelente profissional.
Certamente, apesar das circunstâncias, era também mãe exemplar.
Encantava a freguesia, embora não fosse dotada de beleza física,
mas por sua doçura e delicadeza. Foi escolhida como exclusividade de
um homem rico e sensível que a sentira especial.
Um dia, Dora ficou doente. Não se preocupou de início, coisa
corriqueira, apenas a dor da vida. Mas o caso era grave. Não poderia
permanecer na profissão. Não tinha para onde ir, nem como sobreviver.
Tia Nina, com seu grande coração, não vacilou: levou-a
para casa e dela cuidou com carinho de mãe.
Isso era tudo o que eu sabia da vida de Dora até aquela manhã
de domingo.
Eu estava em casa de tia Nina com meu namorado, seu sobrinho, o mesmo menino
das roupas de antigamente. Conversávamos animados na sala, com o cuidado
de não fazermos barulho para não incomodar Dora. Entrou um senhor
de certa idade, um japonês cujo nome não sei. Trazia sacolas com
frutas e verduras. Olhou para todos nós, fez a reverência costumeira
do povo nipônico, nada disse além de um cochicho com tia Nina,
que não entendi. Foi à cozinha, depositou frutas e verduras sobre
a mesa, tomou uma cadeira, colocou-a junto à porta que se abria para
o quarto de Dora, nova reverência, desta vez mais demorada e visivelmente
emocionada, e se sentou. Não tirou os olhos por um momento sequer de
Dora, imóvel no leito. Dissera o médico que nada mais se poderia
fazer senão esperar. Estava terminal. Olhava as pessoas como se não
as enxergasse. Não mais falava. Gemia às vezes. O homem ficou
sentado à porta, concentrado, olhando apenas. Tinha ternura no olhar.
Após quinze minutos. levantou-se, voltou a cadeira ao lugar, passou à
sala, colocou discretamente uma nota dobrada entre as mãos de tia Nina,
segurando-as por alguns instantes, cumprimentou-nos com nova reverência,
acenou com a mão como quem pede desculpas, saiu sem nada dizer.
Ao meu olhar entre curioso e encantado, tia Nina explicou. Ele a amou sempre.
Faz isso exatamente igual todos os domingos, desde que se agravou o estado de
Dora.
Repetia-se há muito tempo - e só terminou com a morte de Dora,
cinco dias depois - aquele ritual de amor por uma prostituta que foi especialmente
amada.