A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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AO SOM DE BACH

(Olympia Salete Rodrigues)

Bach sempre me comoveu profundamente. Tanto que sempre o ouvi e ouço quando sozinha, recolhida, de preferência à noite. E nunca sei a razão de, ao ouvi-lo, despontarem-me as lágrimas.

Não sei se você se lembra, eu me lembro como se estivesse vivendo aquele momento encantado de nossa vida. Era um sábado à tarde, eu estava sozinha em casa. Você disse que não viria. Resolvi: coloquei Bach na vitrola, me deitei, fechei os olhos e me deliciei. Deixei baixinho o som, como gostava. E me perdi de mim, do tempo, do que me rodeava, mergulhada no som divinal. Como sempre, lágrimas corriam. Deixei que corressem, não as enxuguei, percebi que elas ensopavam o travesseiro. E estava assim, absorta, quase em êxtase... abri os olhos... Um susto! Você me olhando, em pé ao lado da cama, com um sorriso bonito no rosto. Não, não percebi você entrando. E você, quando me surpreendeu, não quis me tirar do enlevo. Eu disse: É Bach. Você sorriu e respondeu com o olhar e um leve balançar de cabeça. Deitou-se ao meu lado, beijou minha fronte, me enlaçou carinhosamente.

Terminado o som, pedi que o repetisse, queria ouvi-lo com você. E assim ficamos, abraçados, reverentes. O clima foi criado sem nenhum gesto provocante. Apenas nossos corpos se desejaram em uníssono. Fizemos amor, um amor calmo e sereno, desta vez tão diferente. Um gozo manso em meio ao meu pranto. Seu rosto deificado diante de meu rosto comovido. O Amor ao som de Bach...

Olhei você com ternura: "Esse amor deveria ser feito de joelhos... Cada suspiro uma prece..."

Sorrimos ao som de Bach!

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