Uma das maiores surpresas da minha vida aconteceu quando soube que o meu corpo
era formado de fragmentos de estrelas. Sentir-me parte integrante da matéria
cósmica, em vez de me assustar, como costuma acontecer a outras pessoas,
foi motivo de orgulho, discernimento e prazer. É tudo relativamente tão
simples! Tão lógico! Não poderia existir, pelo menos por
enquanto, nada mais esclarecedor, racional, sensato, do que a teoria científica
da origem do Universo e dos seres vivos. Tão diferente daquelas histórias
ridículas que me contavam! Outra emoção muito grande que
senti se deu quando vi pela primeira vez uma fotografia da Terra tirada do espaço.
Ao contrário de muitas pessoas que se encantaram prontamente com a beleza
daquele azul; com os detalhes do nosso planeta vistos do alto e com outros aspectos
poéticos e científicos, o que primeiro me chamou a atenção
foi que aquela imagem era a da minha casa; o meu próprio retrato.
Sim, eu estava naquela fotografia tanto quanto estaria em qualquer outra tirada
de uma distância que não fosse suficiente para eu aparecer nela.
Todavia, estava ali presente tanto quanto os detalhes visíveis como os
mares, os continentes, as florestas. Aquela foto era a "prova dos noves"
de que eu e a Terra; eu e o Sistema Solar; eu e a Galáxia; eu e o Universo
éramos partes integrantes um do outro, não obstante a minha pequenez.
Do mesmo modo que uma gota de água não deixa de fazer parte do
oceano por ser apenas uma gota d'água. Outra surpresa encantadora surgiu
quando eu soube qual era a diferença entre a vida e a não vida.
Também tão diferente do absurdo que me ensinavam! E não
estou me referindo a dogmas religiosos. Eram as minhas próprias lições
de Biologia do segundo grau escolar. Algo me dizia que estavam muito errados
aqueles ensinamentos. Dizer que a diferença entre um Ser Vivo e outro
Não Vivo seria a capacidade reprodutiva, equivalia, para mim, a dizer
que a diferença entre a luz e as trevas, seria que na primeira nós
poderíamos ver os objetos e na outra, não. Engolia aquilo calado
só para ser aprovado para a classe seguinte. Mas a minha curiosidade
nunca se satisfazia com isto. Foi somente no curso de pós-graduação
que o meu afã pela verdade se viu, em parte, concretizado. Tão
simples também! Tão claro! Por que não aprendi isto antes?
Senti-me, ao mesmo tempo, satisfeito e ressentido por só compreender
aquilo na terceira década da minha existência. Somente então
pude
entender o fascínio de Galileu Galilei quando percebeu que a Terra não
era o centro do Universo, como se acreditava. O prazer que deve ter experimentado
Sir Isaac Newton ao descobrir por que caem os objetos. O êxtase de Einstein
ao deduzir que matéria e energia são intercambiáveis e,
portanto, constituem a mesma coisa, sendo os seus dois conceitos, nada mais
do que artifícios criados pelos homens.
Tudo no Universo propende para o caos. Toda a energia cósmica tende
a se dissipar irreversivelmente. Nada se perde, tudo se transforma; mas jamais
voltará a ser como era antes. A transformação é
sempre no sentido da dispersão. Tudo é ilógico e anárquico.
Os físicos têm um nome para este fenômeno. Chamam-no Entropia.
Só há um compartimento privilegiado da natureza onde esta lei
não se aplica. Onde tudo faz sentido. Onde nada é casual, caótico,
aleatório. Só existe, no Universo - e até agora nunca ficou
provado existir fora do nosso planeta -, um restrito setor onde tudo é
harmonioso e perfeitamente organizado, ou seja, não se forma nem deixa
de se formar a menor partícula nem a mais diminuta quantidade de energia
que a nossa mente pode conceber, que não sejam absolutamente necessárias,
satisfatórias, precisas. Em outras palavras, onde existe uma lógica
- a lógica molecular dos organismos vivos. Quando eu aprendi isto, a
vida para mim passou a ter outro sentido, outra ótica; muito mais significado
do que já tinha antes. Depois que eu soube disto passei a admirar, valorizar
e amar mais ainda os seres vivos. Todos eles. Desde uma simples ameba ao primata
mais evoluído. Mas, sobretudo, passei a dar muito mais valor à
vida humana. Parece um truísmo; e é um truísmo, mas nem
por isto deixa de ser importante - ninguém ama aquilo que não
conhece. Só pode amar a vida quem sabe como ela é. Como é
provável que tenha surgido sobre este planeta; como funcionam os seus
mecanismos íntimos. Se todos os complexos fenômenos vitais deixassem
de existir, e permanecesse apenas o processo pelo qual os seres vivos se reproduzem,
ainda assim a vida continuaria a ser um fenômeno maravilhoso. A replicação
da molécula mestra que a comanda, e que garante a sua perpetuação
- o DNA - representa algo muito mais milagroso para mim, do que se eu assistisse
à cura de mil paralíticos na gruta de Lourdes. Se existir, de
fato, um maestro que rege esta orquestra perfeita. Se existir um Ser Absoluto,
onipotente, sem limites, que tenha sido o Criador de tudo isto, eu só
tenho de agradecer a Ele por ter feito de mim um apaixonado pelo estudo que
me levou a conhecer um pouco deste prodígio.