Por favor, quem acaso tiver sido atraído para este texto por causa do
seu título, talvez pensando encontrar nele algum estudo, pesquisa, especulação
teórica de natureza técnica, ou qualquer outro aspecto ligado
ao estudo da Psicologia, pode parar por aqui mesmo. A única pretensão
de quem o escreve é revelar certas observações estritamente
pessoais acerca da mudança do comportamento de muitas pessoas depois
do advento da Web.
Talvez seja arriscado generalizar, mas pelo menos até onde pude perceber,
nunca houve uma modificação tão radical dos hábitos
individuais, quanto aquela que foi introduzida pela Internet. Não se
precisa ser um profissional para chegar a essa conclusão; basta ser um
bom e atento observador.
Quando converso sozinho comigo mesmo comento isto: "Cara, o que houve contigo?
Antes de te envolveres com esta engenhoca, tu quase nunca tiveste uma amiga
mulher. Excetuando aquelas da tua família e as namoradas (uma de cada
vez, tudo bem), entre dez amigos teus apenas uma era do sexo feminino; se tanto.
Por que agora se dá exatamente o inverso?" Como vêem, estou
começando a citar minhas observações usando a mim mesmo
como cobaia. É verdade! Concordo comigo mesmo: quase nunca tive amigas
desde que me entendo por gente, até meados de 1999, quando comecei a
navegar por estes "mares". Hoje, praticamente, só tenho amigas
mulheres. Por quê? Certamente muitos dirão: "Isto acontece
porque vives num mundo virtual". Talvez, mas antes da chegada da Internet
quase todo o meu tempo livre passava lendo. Isto seria Real ou Virtual? E se
fosse Real, seria positivo ou não? Em outras palavras, o relacionamento
unilateral entre o leitor e o autor de um livro seria menos pernicioso do que
uma interação entre duas ou mais pessoas, ainda que virtualmente?
O diálogo a seguir, me foi repassado por uma amiga (que nunca vi), mas
a intimidade entre nós é tamanha a ponto de me ter repassado esse
diálogo que ela teria travado com um amigo:
- Somos tão íntimos que nem mesmo o meu marido conhece a minha
intimidade como tu conheces!
- Por exemplo?
- Ele nunca soube deste meu desejo que acabo de te contar...
- Por que não confessas a ele?
- Por que jamais me atreveria a tanto.
- E como estás a confessar a mim?
- Juro como nem eu mesma sei por quê. Loucura, talvez. Ou algo mais...
Às vezes chego a duvidar de que este liberou geral
esteja, de fato, acontecendo. Uma das décadas em que mais se viu ruptura
de tabus; liberação de repressões seculares e outras mudanças
radicais, a ponto de ter sido chamada a "década da revolução
sexual", foi a de 1960. Mas nunca sucedeu nada parecido com o que estamos
vivendo agora. A única diferença - e talvez seja exatamente por
causa dela - é que tudo naquela época foi real.
Mas como já questionei numa outra escrevinhação, qual seria
mesmo a diferença absoluta entre Real e Virtual?
A vida seria Real? Até que ponto? Quando estamos dormindo ela é
Real ou Virtual? E quando estamos sonhando? E quando estamos em estado de coma?
E quando alguém enlouquece? O mundo seguiria Real ou passaria a ser Virtual?
Ou ele seria Virtual para quem está dormindo, para o sonhador, para o
comatoso e para o louco, mas continuaria a ser Real para as demais pessoas?
E, supondo que haja uma vida depois desta aqui, esta seria menos ou mais Real?
Ou Virtual? O que serão a literatura e a arte, reais ou virtuais? A Bíblia,
por exemplo - que ninguém nem sabe quem foi que escreveu - é Real
ou Virtual? Um escritor famoso, um acadêmico REAL, um João Ubaldo
Ribeiro, por exemplo, quando está escrevendo um livro de papel é
um escritor REAL e quando está digitando um texto na Internet não
é mais? Ou o contrário. Eu, por exemplo, que não me considero
escritor nem Real nem Virtual, mas tem gente que me põe este apelido,
se editasse um livro de papel deixaria de ser um escritor VIRTUAL e passaria
a ser REAL? E quando eu imprimo um texto que escrevi na Virtualidade, este -
como num passe de mágica - passaria a integrar o mundo da Realidade?
Chegando agora aonde eu pretendia ir: o que é um relacionamento Real?
O que seria uma amizade ou uma intimidade Virtual? Sei que se trata de um assunto
muito polêmico e delicado, mas temos de enfrentá-lo. Abstraindo
qualquer outro tipo de envolvimento e nos limitando ao estritamente biológico,
um orgasmo virtual deixa de ser um orgasmo porque não foi "real"?
Fato:
- Nunca senti um prazer tão intenso quanto aquele!
- Jura?
- Nunca. Nunca senti!
- Como seria possível se nada foi Real?
- Não sei. Acho que o que eu senti foi mais do que Real.
Fato: Jamais uma convivência virtual poderá substituir uma real.
Há o verso de uma canção da Bossa Nova que diz assim: "É
impossível ser feliz sozinho". Nada mais óbvio.
Apenas alguém leviano e insensato discordaria do poeta.
Fato: Nunca se ouviu falar em divórcio virtual; em querelas judiciais
virtuais; em brigas virtuais por causa de reivindicações pela
guarda de filhos ou pelo patrimônio de um casal. Violências virtuais
de homens contra mulheres (ou vice-versa) pode ser que ainda venham a suceder.
Quem sabe, até assassinatos em legítima defesa da "honra
virtual". Mas não, por enquanto.
Boato: "Tudo o que acabaste de dizer é falso, não faz sentido,
é ridículo, fantasioso e nem merece ser discutido!"