A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
  • aumentar a fonte
  • diminuir a fonte
  • versão para impressão
  • recomende esta página

RAZãO DE VIVER

(Dorcila Garcia)

Estarmos vivos deveria ser, por si só, uma razão de viver. O nosso respirar é uma dádiva preciosa que recebemos do Criador, mas é algo tão natural que nem notamos. Sequer refletimos sobre o valor do presente que nos foi dado. Não nos basta. Precisamos de uma razão palpável. Tanto é assim que podemos estar vivos sem viver. Sem um sentido para as nossas vidas, somos meros seres viventes que só estamos no mundo porque ainda não exalamos o último suspiro. Espiritualmente, já estamos mortos. Somos uma multidão de januárias caricatas debruçadas nas janelas do desalento, vendo a vida passar.

A vida precisa ter um sentido, uma mola propulsora que nos dê força e coragem para ir em frente. E essa força não é a mesma para todas as pessoas, mas é, certamente, o alvo do amor de todos nós. Para uns, são os filhos. Para outros, os pais. Pode ser marido, mulher, família, profissão, sonhos. Ou isso tudo. É essencial que o ser humano tenha uma razão de viver. Sem dúvida, o homem e a mulher devem amar sua família, ter amor à sua profissão, sonhar e, em tudo isso, encontrar razões para enfrentar a vida, para prosseguir nos momentos difíceis.

Por outro lado, é temerário termos nossa razão de viver calcada unicamente nas pessoas, ainda que elas sejam nossos entes queridos, porque delas seremos apartados um dia, seja pela nossa partida desta vida ou pela partida deles. Essa é uma verdade inexorável. Quando isso acontece, desmoronamos, ficamos sem chão, sem eixo e a vida perde o sentido.

Muitas vezes, nem é preciso chegarmos ao extremo de uma morte. Quando os filhos saem da casa dos pais, seja pelo casamento ou pela independência natural que todo ser humano procura, os pais freqüentemente perdem a razão de viver. A vida deixa de ter sentido para eles. Não se sentem mais necessários. É quando, se não estiverem atentos, caem facilmente nas malhas da depressão.

Pode até parecer que não devemos afeiçoar-nos a nenhuma pessoa, já que um dia vamos perdê-la ou ela vai nos perder. Mas não é assim. Não viveríamos sem amor, sem estarmos cercados das pessoas que amamos e sem darmos a elas o melhor de nós e recebermos a retribuição desse afeto.

Para não nos perdermos de nós mesmos, especialmente quando atingidos pelas adversidades, precisamos de um sentido para nossas vidas. Para se ter uma razão de viver é necessário saber viver, extraindo de cada instante da vida tudo o que ela tem de mais precioso. Saborear as coisas simples sentindo na boca um gosto de ambrosia. Retribuir cada gota do amor recebido com um manancial de afeto. Transitar pelas glórias do mundo sem nenhum resquício de soberba. Valorizarmos as amizades. Enfim, permearmos nossa vida pelos bons sentimentos.

No entanto, aliada a essas razões, precisamos de uma que suplante a todas. Uma razão maior, universal. Esse sentido grandioso só é possível encontrar em Deus. Ele é força, abrigo, acalanto, consolo. Somente Deus pode estar conosco em todos os momentos da nossa vida, ainda que muitas vezes não o percebamos. Por Ele, nunca seremos abandonados, pois ele é misericordioso e eterno. Apenas tendo Deus como nossa suprema razão de viver, estaremos, de fato, vivendo.

Copyright © 1999-2020 - A Garganta da Serpente