Numa rua sossegada, uma casa geminada, de número cinqüenta e dois.
Paredes amarelas, janelas enormes, abertas para o mundo, um portãozinho
verde e um pequeno jardim...Luz e cor, uma moradia repleta de vida e de amor.
Nas calçadas, meninas pulando amarelinha e meninos com bolas de gude.
Na parede da sala, um santuário, noite e dia iluminado...Ali, aprendi
a rezar. À noite, o guarda noturno, passos únicos no asfalto,
ecoando nas madrugadas. No quintal, as mangueiras, goiabeiras, bananeiras...
Na amoreira, bem perto da rua, cada um dos cinco, era dono de um espaço.
Lá de cima, eu achava que via o mundo. O sol, filtrado entre folhas,
mantinha minhas bochechas coradas. Pilheriava com os transeuntes: "Vai
cair daí, menina!"..."Caio, nada!",eu respondia.
Uma tarde, o tronco da amoreira se vestiu de vermelho, do alto à raiz.
Era sangue. Meu irmão, (tão bonzinho!), fazendo um estilingue,
com um facão, quase decepou o meu dedo.
Mais de quarenta anos...Parece que foi ontem. Restou tão pouco da minha
infância tão feliz: grandes e belas lembranças e uma cicatriz...