Se meu pai estivesse aqui, estaria com oitenta e nove anos. Morreu com sessenta
e seis.
Certamente, estaria com o corpo encurvado, o rosto enrugado, os cabelos branquinhos,
mas o olhar teria a mesma expressão de ternura, de carinho. Meu pai deixava
que o amor transbordasse por seus olhos esverdeados. Sua ausência é
um buraco vazio, que jamais será preenchido, seu semblante está
tão nítido na minha mente, como se tivéssemos deixado de
conviver ontem.
O dedo de Deus o tocou...meu pai adormeceu. Como pode alguém dizer
que não crê em Deus? Eu testemunhei o seu sofrimento, pela doença
consumido, o vi morrer. Logo depois, seu rosto foi se transformando. Se tornou
límpido, tranqüilo, como se tivesse adormecido, feliz e aliviado.
Sua alma deixou o corpo doente que a aprisionava. O Senhor o libertou.
Depois desse dia, quantas vezes, me vi contemplando o infinito! Sei que ele
está com o Pai e um dia, nos encontraremos. Será lindo o nosso
abraço. A morte não nos separou. Tenho a maior herança
que ele podia ter deixado: a fé. Ele não morrerá enquanto
estiver vivo nas minhas lembranças.
E como é bom lembrar do meu pai! Das suas brincadeiras, das músicas
que fazia para mim, das histórias onde eu sempre era personagem principal.
Como esquecer da mão trêmula que segurava a minha no dia do meu
casamento, ou da lágrima que insistia em rolar, na minha formatura? Como
esquecer o amigo que tive nos momentos de doença dos filhos, sempre ao
meu lado, ajudando, orando, dando seu carinho de avô?
Não tem a menor importância o que meu pai foi, na sua passagem
por aqui. Se foi grande para o mundo, ele há muito o esqueceu. As pessoas
vão e a vida segue seu ritmo.
O que importa mesmo é a lembrança que tenho do grande amigo que
Deus me deu o privilégio de ter ... e que perdi.