A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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A grama do vizinho é mais verde

(Maria José Zanini Tauil)

Interessante. O boi pisa no pasto verde e passa o pescoço pela cerca para tentar comer o capim seco do outro lado. O ser humano também é assim. O proibido tem gosto especial e é mais excitante.

Um amigo meu dizia que seria muito feliz quando pudesse ter um apartamento em frente à praia, que viveria admirando a paisagem. Um dia, realizou o sonho. Nos primeiros tempos, muito encanto, muitos convites para um chopinho na varanda. Hoje as janelas vivem fechadas e ele passa semanas sem contemplar a paisagem que dali se descortina. Deixou de ser novidade. Já havia fotografado aquele cenário na retina.

Assim acontece com os casamentos. A rotina do dia-a-dia faz com que casais que outrora se amaram tanto, virem parentes. A relação fica morna e sem graça. A atração acaba.

Segundo Jorge Linhares, pastor e escritor, o casamento é uma viagem a dois, mas muitas dessas viagens têm sido interrompidas ou um dos viajantes desce na primeira parada.

Quantas viagens poderiam ser lindas, cheias de prazer e acabam sendo experiências terríveis porque ignoramos as placas de advertência na estrada da vida.

Precisamos olhar para a frente e deixar de remoer o passado, pois ele pode melhorar o presente, mas também destruí-lo.

É preciso confiar no outro, mas também estar atento para que não falte o combustível principal: o amor. Tudo na vida precisa de ajustes com o tempo. O diálogo determina quais são os parafusos frouxos no relacionamento.

O sexo é sempre uma armadilha. A grama do vizinho é mais verde. Ninguém é forte e a carne é fraca.. Opostos que antes se atraíam passam a se repelir. Não aceitamos as diferenças e, no entanto, foram elas que levaram à atração inicial.

Há os que não acreditam em casamento perfeito. Eu creio.

Meus sogros, João e Arlette, fizeram sessenta anos de casados.. Em trinta anos de convívio, jamais presenciei qualquer cena em que um falasse rispidamente com o outro. Eles são metades que se completam, têm perfeitos encaixes , que mesmo na velhice, com as limitações da idade são como as rodas da bicicleta: só funcionam juntos.

Ele, aos noventa, é um homem forte e tem memória fraca. Ela, aos oitenta e um, é frágil, tem dificuldades para caminhar e uma cabeça prodigiosa, memória e perspicácia perfeitas. Ambos se apóiam e caminham juntos como se fossem siameses. Ela é a cabeça e ele o corpo. Isso é união. Caminhar juntos na mesma direção.

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