Os times brasileiros de futebol não deram sua cota adequada de contribuição
para que o povo desperte da ilusão de que tudo está bem. Mesmo
com um futebol de baixa qualidade, conquistaram merecidamente os títulos
em seus estados e com isto, provocaram euforia em quase metade da população
nacional, que por alguns dias esquecem a falta de alimentação,
saúde, emprego e esperança. Permanecem anestesiadas por quase
um mês dando tempo ao governo para se arrastar mais um tempo sobre suas
trapalhadas. As festas pelas conquistas ainda ecoam pelos ares, alimentando
a alma da população sofrida. O brilho dos campeões supera
o perigo dos futuros apagões e falta de futuro para nossos jovens.
Já a seleção nacional, composta por jogadores que já
estão bem estabelecidos na vida, mas são oriundos de regiões
pobres e sofredoras (e ainda se lembram das dificuldades dos tempos da infância),
numa profunda demonstração de civismo, comandados por Dunga, abriram
mão de disputar um título inédito na China, que poderia
lhes render mais alguns milhares de dólares nos prêmios e atuaram
de forma bisonha, para não correrem o risco de vencerem um torneio preparado
pelos patrocinadores para colocá-los na final. Com isto, evitaram heroicamente,
que o governo usasse o feito como mais uma realização social em
prol da felicidade geral.
Agradecemos a Dunga (o bravo comandante desta cruzada heróica), tentando
nos impedir que cheguemos à copa de 2010 e aumentando a insatisfação
popular, nos permitindo congregar forças para derrubar este sistema que
nos asfixia e nos transforma em escravos das elites dominantes. Temos de torcer
para que ele (ou o próximo técnico) dê continuidade a este
caos para receber uma estátua tão logo tenhamos sucesso em nosso
projeto de libertação da nação. Espero que não
chamem o Luxemburgo. Se o chamarem, que não aceite, para não ajudar
aos abutres no uso indevido do esporte para esconder suas sujeiras.
Já imaginaram a tragédia que pode acontecer se a nossa seleção
vencer a copa em junho de 2010? Os jornais domesticados pelos poderosos patrocinadores
que enriquecem à custa de nosso sofrimento eterno, ficarão ocupados
com manchetes relativas ao feito esportivo durante quatro meses. Será
lançada uma novela no horário nobre mostrando a vida do artilheiro
que nos deu o título. Neste período, os abutres do poder terão
tempo de sobra (antes das eleições) para adulterarem as urnas
(já treinaram no Senado) e montar os conchavos de fatiamento do que ainda
resta do nosso sucateado patrimônio público.