Até o final dos anos 70, os líderes estudantis, de sindicatos
e entidades representativas da sociedade, possuíam espírito cívico,
disposição e uma grande vontade de contestar os dogmas internacionais
e transformar o Brasil em nação realmente independente para traçar
seu próprio futuro. Tiveram coragem de externar seus pensamentos abertamente
e muitos foram sacrificados pela ditadura conduzida por alguns deslumbrados
que assumiram o rumo da nação sem planejamento. Estes líderes
foram rotulados de "reacionários" e "comunistas"
- aqueles que não aceitavam a submissão passivamente. E a maioria
destes condutores, não teve nenhum curso específico para exercer
esta função. Eram movidos pela indignação, percebiam
os riscos que nossa soberania corria e tinham orgulho em defender a pátria
com palavras veementes e fôlego nacionalista. Sempre foram considerados
"espinhos" nos interesses da elite abutre e mais recentemente, apelidados
de retrógrados que tentavam obstruir a evolução das nações
livres (?) do planeta, chamada de globalização. O que poucos percebem,
é que tais elementos, iluminados formadores de opinião para o
bem, tentam há longo tempo, clarear a mente dos que são eternamente
escravizados pelo capital estrangeiro sem pátria em troca de migalhas
para sobreviver. E ainda são direcionados a agradecer sorrindo por ainda
poderem lamber as botas de seus algozes que desfrutam das riquezas pelas quais
até invadem terras alheias para não pagarem o preço justo
pela mercadoria desejada.
As elites da época, que já vendiam a nação lentamente,
entraram em pânico com a disposição destes nativos cuja
nacionalidade brotava renovada na superfície da pele a cada instante.
Perceberam que seus "negócios" sofriam ameaças de falência.
As bocas gananciosas internacionais pressionavam nossos dirigentes, ameaçando
cortar os "empréstimos" (que multiplicavam a nossa dívida
fictícia) generosos, que engordavam as contas bancárias dos dirigentes
nos paraísos fiscais. A elite provocou as forças patrióticas
para que a revolução ocorresse em 1964, com o mínimo de
perda dos patrimônios acumulados de forma duvidosa. Infelizmente, os militares
da ocasião não tiveram sensibilidade suficiente para conduzir
o processo com o sucesso desejado pelo povo, pois os poderosos da época
souberam se camuflar, "sugerir" certas ações do seu
interesse (alguma propina foi gasta com alguns militares gananciosos e de influência
no comando) e desviar a atenção para os elementos que se deixavam
levar pela emoção.
Depois que o país se aquietou e a "abertura" foi liberada integralmente,
o governo voltou às mãos da elite efetivamente, agora mais cuidadosa
com as ameaças que regularmente rondam seus limites. Começou o
sucateamento das escolas, faculdades e sindicatos defensores legítimos
de empregados normalmente tapeados. Reduziu-se o orgulho dos professores, através
da injustiça de péssimos salários. Eliminaram temas de
resgate da cidadania. Em suma : degradou-se o ensino, a porta principal de ameaça
aos planos dos abutres.
Trataram de eliminar os principais líderes remanescentes e cuidaram de
contaminar as gerações correntes com festivais de rock e outros
atrativos similares, bem como facilidades para distribuição de
drogas, que passaram à categoria de crimes leves. Criaram armadilhas
para denegrir a imagem da mulher, atraindo-a para fora do lar através
de propagandas que passam a idéia de que donas de belas curvas merecem
receber mais do que as que possuem alta capacidade intelectual para melhorar
nossas qualidades de vida. Esta prática dificulta a disseminação
de bons costumes dentro do lar.
Permitiram que os jovens adquirissem direitos (na verdade, desobediência
aos pais e quebra de valores morais que sustentam a família), que deliciados
e iludidos pela "liberdade" de decidir seu destino longe dos pais
atarefados com a busca do sustento, entraram em estado de excitação,
deixando de lado as preocupações com o universo que os envolvia
e com o caminho incerto que os espreitava com as armadilhas montadas nas esquinas
da vida. Seus diálogos sobre o destino de nosso futuro, retroagiram aos
primórdios da humanidade e se resumiram a frases do tipo :
- Oi, bicho ! Tudo em cima ? Valeu, mermão ! Tô numa nice !
Com isto, os líderes de 2ª linha, já mais idosos, com netos
para cuidar, sem um público para escutá-los, não formaram
novas lideranças. Escreveram muita coisa útil, quase sem chance
de publicação. A cultura também foi relegada a um 3º
plano (bons tempos em que ela estava no 2o.). Acabaram com os festivais de músicas
populares, que traziam em seu bojo o protesto, fácil de ser memorizado
em verso pela população sofrida. Alguns elementos foram infiltrados
nas fortes uniões estudantis, sindicatos, grupos sociais diversos e principalmente
na imprensa, para assumir a liderança destas entidades, sempre atentos
para não permitirem que fossem iniciados movimentos que pudessem ameaçar
a doce estabilidade dos párias que sugam nossas enormes riquezas à
custa de nosso suor, sangue e dignidade. Vendem a pátria e se mudam para
as terras de seus compradores, ávidos por serem requisitados para novas
tramóias.
E assim, após três décadas sem exercitar a cidadania plena,
a hipnose tomou conta de nossos patriotas, que foram levados lentamente a um
estado de miséria e desespero profundo, a tal ponto que reverenciam de
joelhos qualquer medida que lhes devolva 10% do que têm direito. Estamos
num tal estado de letargia, que apenas sonhamos em ganhar uma bolada na loteria,
que nosso filho se torne um craque de futebol ou nossa filha tenha uma bunda
avantajada para rebolar num conjunto musical desafinado, contendo letras sem
nenhum conteúdo poético ou mensagem útil para os ouvintes.
Só nos indignamos com algum fato absurdo, pelo tempo que a mídia
determina. E ela controla isto bem, reduzindo gradativamente o tamanho das manchetes
e a aparição na tv. O caso do ônibus 171 no Jardim Botânico
no Rio é um exemplo gritante deste comportamento. O seqüestrador
ofereceu dezenas de oportunidades para que os atiradores de elite, a menos de
15 metros do alvo, acabassem de imediato com o drama das pessoas apavoradas
dentro do veículo. Mas se o evento terminasse desta forma, a tv perderia
muitas horas de alto índice de audiência (sem ter de pagar ao ator
principal) pelo clima de suspense mais envolvente que qualquer roteiro de alguma
novela inócua já produzida até hoje.
A chama da indignação se reduz e termina com uma passeata silenciosa
e disciplinada, com todos vestidos de branco, patrocinada pelo "Viva Ri(
c ) o". O povo só reúne energia para se mobilizar durante
48 horas para pintar ruas na época da copa mundial de futebol. Jamais
se junta por 2 horas para protestar em frente ao palácio do Prefeito
ou do Governador para exigir que seus impostos atendam os problemas da comunidade.
Se for preciso acalmar a turba ensandecida, autoridades solicitam que dentro
de uma versão de um Big Bobo Brasil seja colocada uma "noiva virgem"
(?) para que o povo telefone (e paga por isto) para salva-la do paredão
e evitar que seu vestido se manche com as lágrimas forjadas por cebolas
coladas nos cílios.