A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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O túnel desmoronado

(Haroldo P. Barboza)


A iniciativa da AMB (Associação de Magistrados do Brasil) em criar um processo para que a população possa compreender as terminologias usadas pelos advogados é louvável. Tem até concurso interno no site exclusivo para quem é da área. Mas esta "abertura" não é a única medida a ser adotada no sentido de estabelecer um laço mais sólido e confiável da área jurídica com o restante da sociedade. Dezenas de outras ações precisam ser elaboradas na intenção de se resgatar a CREDIBILIDADE das entidades jurídicas de nosso país perante a população que não percebe vozes de personalidades lutando pela tão decantada igualdade que justifica a existência dos que zelam pela mesma.

A atual situação de caos de imoralidade pública que recheia o mar de lama que inunda as esferas governamentais, certamente é mais um catalisador para agilizar a convulsão social que nos ameaça com maior intensidade nos últimos 20 anos. Se alguma cruzada cívica no sentido de mudar o comportamento de nossos dirigentes não for sustentada por entidades das quais sentimos orgulho (arranhado pelo estranho silêncio ora em voga), a herança que deixaremos aos nossos herdeiros não será das mais desejadas.

Apesar de ter seguido a carreira Matemática, nos últimos 8 anos passei a enveredar pelas trilhas da Literatura, acumulando algumas premiações. Tal lastro não nos concede méritos bastantes para pretender ensinar colegas juristas experientes a conduzir suas entidades em busca da harmonia com seus requisitantes. Mas também não impede que externemos nossos sentimentos em relação à visão que temos deste segmento, que podem estar afinados com outros milhões de integrantes do povo que nem sempre possuem facilidade de expressão, tempo e equipamentos adequados para desenvolver suas idéias.

Em resumo, sem ordem de prioridade, imaginamos no mínimo as seguintes medidas para que passemos a confiar de fato em nossa Justiça.

01 - Criar uma tabela de "tradução" dos termos cotidianos jurídicos que passariam a ser constantes nos meios de comunicação, nos editais públicos, contratos e nas conversas com clientes. O termo popular poderia ficar entre parênteses nas certidões, após os termos técnicos usados por elementos do ofício.

02 - Pressionar Legisladores de todas as esferas para revisão nas atuais Leis em vigor no sentido de eliminar as controvérsias, as dubiedades, as obscuridades, as exceções nebulosas, as redações sofisticadas, que apenas servem como brechas para que os pilantras abastados possam escapulir ilesos ou com leves arranhões pelos ilícitos cometidos.

03 - Programar mutirões regulares com ajuda de alunos já no último ano da Advocacia para lhes dar a oportunidade de "meter a mão na massa" (como se diz isto em Latim?) e desentupir as prateleiras dos processos que há 20 anos estão mofando em locais infestados de cupins e outros predadores. Normalmente estes processos são os que pobres abrem contra poderosos.

04 - Informatizar TODO o sistema jurídico. Desde o momento da abertura de um inquérito, até o julgamento final da causa. De forma que o mesmo possa ser acompanhado (em todas as instâncias) por seus interessados. Não esquecer de criar backups espalhados, assinaturas criptografadas, senhas inteligentes e locais seguros e vigiados para o armazenamento. Já estamos saturados de ver notícias de prédios velhos queimados contendo documentação que poderia prejudicar grandes empresas contra indefesos trabalhadores.

05 - Buscar a sintetização dos textos, sem firulas. Fica difícil acreditar que um Advogado faça uma "vista de processo" em 15 dias, de pastas que acumulam 10.000 ou mais páginas. Até romances agradáveis de 350 páginas demoramos mais de uma quinzena para devora-lo.

06 - Da mesma forma que a "Voz do Brasil" tem seu horário reservado no rádio diariamente, a AMB, OAB e outras, devem solicitar uma hora semanal da "Voz da Justiça" para esclarecer Leis polêmicas, orientar casos de repercussão, responder dúvidas daqueles que não possuem o hábito de transitar por este universo.

07 - Dar ênfase aos tribunais de pequenas causas. Sem exagerar, quase que se deve ter um em cada esquina. Pelo menos em locais de fácil acesso, como estações do Metrô, trem, terminais rodoviários - mais uma vez estudantes do último ano passariam a exercer sua atividade com prazer, no campo de batalha - antes de obter o diploma, o formando deveria prestar este tipo de serviço à sociedade.

08 - Definir posição veemente nas questões nacionais. Não se omitir. Quando do movimento para derrubar Collor, todas as entidades se apressaram para tornarem-se signatárias do grande movimento popular conduzido pela tv. Quem abre mão de seus 15 segundos de fama? De lá para cá, dezenas de ações danosas estão sendo perpetradas contra a nação e as tais entidades permanecem em silêncio, assistindo o rebanho à procura de uma luz no fundo do poço, tendo em vista que o túnel desabou há muitos anos.

09 - Abraçar com convicção a causa da exigência do voto IMPRESSO pelas urnas eletrônicas passíveis de adulteração. A democracia não terá certidão válida de existência num processo de votação onde não existem mecanismos para se comprovar a lisura dos resultados. O sistema é tão suspeito que mesmo no planalto os eleitores para escolha da presidência da Câmara não o utilizam. A lembrança da fraude do painel do Senado ainda está latente em suas memórias. Imaginem o que não se pode fazer com ferramentas que invadem até os seguros sistemas da NASA!

10 - Demonstrar que não existe corporativismo em suas fileiras nos casos em que seus integrantes são identificados praticando ilegalidades sob o manto sagrado da Lei. Que tais elementos, que prestaram juramento de servir à Verdade, sejam banidos das fileiras onde pessoas honradas e patriotas vislumbram (ainda que tênue) alguma esperança de entregarmos um país viável aos nossos herdeiros.

  • Publicado em: 25/08/2005
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