A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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Prudência pouca é bobagem

(Belvedere)

Era intensa a euforia experimentada pelas moças na primeira vez que participaram de blocos pré-carnavalescos naquela cidade tão famosa por sua alegria e calor humano.

Helena Maria, sentada num bar junto com as amigas Edna e Alba, olhava a sensualidade mostrada pelas moças que dominavam as danças. Era um encanto os trejeitos à medida que o som ia num crescente. Impossível não se contaminar pela alegria.

Não demorou muito para que elas pegassem o jeito, e lá estavam, exibindo sua beleza e molejo de corpo; sorrisos, olhos brilhando e muita sensualidade.

Um homem bonito e desconhecido as olha. Fingem não notar e voltam à mesa. Ele se aproxima e passam a conversar animadamente. Pede muita bebida, comida, inclusive lagosta, e no final paga, sem reclamar, toda a despesa.

É madrugada quando decidem ir embora, e ele se oferece para levá-las à casa em que estavam. Não tiveram receio, pois ele mostrava-se tão solto, tão simpático, que nada podiam esperar de mal.

Percorreram várias ruas. Algumas fora do itinerário. Demora infinita. Helena Maria, já nervosa, pergunta a ele para onde as leva. Ele nada diz e pára. Pede que todas desçam e tirem as roupas. Elas se desesperam, e ele mostra o revólver apontando para a cabeça de Helena Maria. Começa, então, a acariciar Alba, que na ocasião tinha 16 anos. Helena diz: "Faça o que quiser comigo, mas deixe-a em paz, é uma criança!" E ele fez com ela o que quis. Tudo sob a mira de um revólver reluzente. Poupara Alba, graças a Deus, pensou Helena Maria.

A todo momento colocava a arma, ora na cabeça, no peito, pescoço das moças, aterrorizando-as de forma desumana. As três, em pânico, nada podiam fazer. Lugar ermo, nenhuma alma... Ele diz: "Corram, desapareçam e não olhem para trás." E elas correram, parando numa casa no alto de um morro onde viram luzes acesas. Falaram com o dono da casa e este ofereceu o telefone para que pedissem ajuda. Quando olharam para a rua, lá estava o carro do desconhecido. Parado. Elas começaram a gritar. O dono da casa chamou a polícia. Foi o tempo do homem desaparecer.

As moças, então, chamaram um táxi e foram para casa.

No dia seguinte, comentaram o caso com um primo de Edna que morava lá e ele explicou que naquela época muitos foragidos vinham para a cidade e era difícil encontrá-los, pois mudavam de carro, alugando-os em diversas lojas. Ele, porém, se incumbiu de procurar o tal forasteiro. Rodou dias e dias pela cidade, cheia de turistas, e nada encontrou.

Carnaval, bebidas, euforia... excessos. Ingredientes que mal-administrados levaram a uma aventura que certamente, por mais que os anos passem, nunca sairá da memória das três moças que achavam que o homem era bom. Afinal, havia pago toda a despesa no bar e conversara tão animadamente...

A lembrança do cano frio de um revólver até hoje arrepia as moças, passados exatamente quinze anos dessa história.

Prudência pouca é bobagem...

  • Publicado em: 07/02/2005
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