De repente pareceu-me ver Bobby Charleston no meio da multidão. Há
anos não o via e corri para alcançá-lo. Ao me olhar pareceu
não me reconhecer, e aí perguntei se não era Bobby Charleston.
Começou a rir... Disse que nunca ouvira tal nome e que certamente eu
o estava confundido com outra pessoa.
Lembrei, então, que Bobby tinha uma cicatriz no pescoço, resultado
de um acidente de carro. Olhei e não vi a cicatriz. Inconformada por
passar tamanha vergonha, disse a ele que estava tudo bem. Frisei que se fossem
gêmeos talvez não se parecessem tanto. Não sabia onde esconder
a minha cara.
Bobby era uma figura excêntrica, mas adorável. Usava uma gravatinha
borboleta quando ia aos bailes. Jovem ainda, aquele estilo era surpreendente.
Tinha um gosto excepcional para músicas e adorava dançar. Exímio
dançarino.
Nunca mais vi Bobby... ele fazia questão da grafia. Não admitia
uma letra fora do lugar desse nome que passara a adotar em sua adolescência
e que perdurara nos doces dias de juventude.
Como a gente pode se perder assim das pessoas?
A partir desse dia que o confundi com outra pessoa, me bateu uma saudade tão
grande dele que decidi procurar por todas aquelas pessoas que conviviam conosco
na época e as convidar para um jantar num restaurante, ou daqui de Niterói,
ou do Rio de Janeiro. Se necessário fosse, São Paulo estava nos
planos também.
Contatei algumas pessoas e demos início a essa busca frenética.
Passados quatro meses, já começamos a encontrar algumas pessoas.
Soubemos, por exemplo, que Paulinho II, o mais paquerador da turma, agora é
um sério pastor. Casado, com cinco filhos. Marylucia Mendes, que vivia
dizendo que seria missionária na Índia, vive entre a rota Brasil-Estados
Unidos. É enfermeira muito bem-sucedida.
Teremos que agendar o jantar num período em que ela esteja aqui. Até
o momento não encontramos Bobby, mas a busca continua. Já encontramos
muitos, mas contabilizei em trinta os integrantes da turma daquela década
de setenta.
Edna Maria, que é assistente social, nas horas vagas está nos
ajudando muito. Conseguiu encontrar diversos integrantes através da internet.
Faltam oito agora, tirando os três que já estão no andar
de cima.
Voltando ao Bobby, quando ele aceitava dar uma de crooner era demais! As moças
fingiam desmaiar, gritavam como na época de ouro da rádio nacional...
na verdade a maioria era louca por Bobby. Ele apenas fingia não saber,
e cortejava todas.
Finalmente encontramos uma pista de Bobby. Um amigo disse-nos que estaria na
Austrália e nos passou o telefone de seus pais. Liguei logo para seu
Ydeo, na esperança de localizar o meu querido e inesquecível Bobby.
Ele atendeu, mas não se lembrou de mim, sequer quando disse que eu era
aquela que gostava de colocar uma rosa no cabelo e ele dizia que eu parecia
uma cigana... bem, muito tempo, ele deve mesmo ter esquecido. Insisti por saber
de Bobby. Ele riu e disse que Bobby, há exatamente dezesseis anos, vivia
numa fazenda com sua terceira esposa, uma moça de vinte e dois anos,
e com todos os seus onze filhos, frutos de casamentos anteriores e do atual.
Fora um projeto acalentado por ele durante toda sua juventude, disse-me seu
Ydeo. Bobby tornara-se um ser cuja ojeriza ao caos urbano beirava o anormal.
Conforme o tempo passava, ele piorava, até que conseguiu realizar seu
desejo. Tornou-se um outro homem.
Na fazenda a paz era total. Viviam todos em harmonia com a natureza, e na necessidade
de alguém ir até a cidade cada um era escalado de forma que ninguém
fosse penalizado. Pensei o quanto seria difícil convencer Bobby a nos
acompanhar, a integrar o encontro da turma. Dei meu telefone a seu Ydeo para
que o passasse a Bob.
Ontem à noite, passado exatamente um mês desse telefonema, ao atender
ao telefone ouvi um homem falando inglês. Não era Edward, o marido
de minha prima, que é americano. A voz era diferente. Tanto falou que
tocou no jantar. Aí vi que era Bobby Charleston! Que alegria! Abracei-o
mentalmente, sorri, sorri tão embevecida com suas palavras, relembrando
nossa juventude, nossas festas, ele cantando...
Para concluir o caso, pois já está se alongando demais, digo que
o jantar será na fazenda dele, localizada no interior de Minas Gerais,
que tem quinze quartos e várias salas. Ainda tem seis chalés no
fundo e pode hospedar todos por um final de semana. E Bobby ainda disse:
- Terei o prazer de oferecer o jantar e muito melhor que isso: eu voltarei a
cantar. Por vocês. Por essa alegria que vem se somar a tantas que a vida
tem me proporcionado.
Despedimo-nos, e ao fundo, do lado de lá, eu ouvia um chorinho de bebê...