Imersa na leitura de O feitiço da lua, de Márcia Frazão,
e na ânsia de chegar ao final das excelentes narrativas da autora, sem
mais nem menos me vejo à mesa do lanche na casa de minha avó.
Enquanto bisa prepara os bolinhos de chuva, sinto o cheiro de café sendo
coado, o pão quentinho, e eu a passar a manteiga que se derrete de forma
lânguida. Conversa vai, conversa vem, e vejo vovô risonho, com sua
bengalinha. Chegara cedo do trabalho para comemorar o evento.
Meus tios se juntam, minhas tias chegam trazendo cada uma um tipo de iguaria,
para que seja um lanche inesquecível. Vovó aproveita para servir
licor de jenipapo, pois nunca perde a chance de mostrar seu talento nos diversos
licores que prepara com carinho e esmero. São sempre elogiadíssimos.
A toalha da Ilha da Madeira que cobria a mesa fora trazida por Tio Jalmir. Linda.
Que alegria! Há quanto tempo não via essas pessoas. Andavam tão
sumidas. As vozes chegavam me alegrando e a minha vontade era a de absorver
tudo de forma a nunca mais deixar o tempo levar aquele momento mágico.
Bisa cisma em dançar o vira... vovó a contém, como sempre!
Eu sorrio, e parece que o tempo vai congelar, tamanha a felicidade que me invade
o coração.
Sinto, então, um solavanco em meu corpo e acordo com uma saudade imensurável
me apertando o peito e pedindo que vovó e bisa me resgatem por alguns
minutos. Aguardo, convicta de que o tempo-espaço é algo difícil
de se entender. Elas virão.
O tempo vai passando...
Ouço as buzinas dos carros nas ruas, músicas que chegam das casas
vizinhas, falatórios...
Vem, então, o gosto amargo do pão quentinho não comido,
do bolinho de chuva, do café...
Onde ficaram os risos, as conversas, os sonhos daqueles que jamais tornarei
a ver?
Como pode doer a saudade!