Dona Ziza era mulher amarga. Difícil ter uma palavra amiga, de incentivo;
nada para ela parecia ter o tom preciso. Perto dela as pessoas sentiam-se como
peixes fora d'água. Tinha um armarinho, no qual vendia linhas, agulhas,
rendinhas, fitas etc. Quando a clientela ia desaparecendo, devido à sua
falta de tato, dona Ziza fazia uma queima de estoque e o pessoal voltava. Logo
vinha sua ranhetice, e as pessoas sumiam. Era algo que parecia não ter
fim.
Particularmente nunca me senti à vontade no armarinho, visto que, sendo
pessoa de muitos chamegos, efusiva, e ela, seca, fria, realmente a mistura não
combinava. Muitas vezes precisei de rendinhas, de fitas de organdi e tive que
recorrer a ela. Não nego que minha avó fez para mim belos vestidos
graças a seus enfeites.
Certo dia, fui surpreendida com a notícia de que a casa onde estava situado
o armarinho seria fechada por falta de pagamento de aluguel. No lugar surgiria
um sebo. Isso! Uma loja de livros usados.
Fiquei tão feliz que naquele dia passei perto de Dona Ziza e disse que
ela parecia uma velha solteirona, rabugenta, e que graças a Deus não
precisaria mais olhar sua cara. Não me importava ficar sem rendinhas,
fitas... não precisava mais dessas bobagens de crianças! Meus
vestidos agora eram de mocinha!
Mil vezes livros sebentos, nos oferecendo um mundo novo, com alegrias, aventuras,
muito diferente da indiferença que ela demonstrava pela vida e pelas
pessoas.
Foi uma festa a inauguração do sebo. Nem seu Tobias, o dono do
estabelecimento, entendeu a alegria das crianças! Houve fogos, banda
de música e apresentação circense. Eu, fantasiada de palhaço
Carequinha, fiz tudo exatamente como ele fazia na televisão! Um sucesso!
Dona Ziza, sumiu do mapa. Ninguém sabe, ninguém viu...
Era uma alegria passar pela rua e não ver mais aquela cara que parecia
estar de mal com a vida...