A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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O dia que ficou num sonho

(Cristiana de Barcellos Passinato)

Tenho um sonho repetido que diz uma tia minha ser real, mas minha mãe sempre desmente, pois foi chocante para mim de tal forma que não deixo de sonhá-lo.

Tão chocante para mim quanto para ela que ficou psicótica e neurótica com a questão de quem leva e pega sua filha e depois o seu casal de filhos para o colégio ou seus afazeres.

Já que trabalhava e meu pai também não tinham hora para me buscarem na escola, muitas vezes que me lembro usava condução escolar.

Nesse colégio Montessoriano foi bem diferente, minha mãe que era a incumbida pela saída, sendo eu a única filha era normal que a mãe nunca viesse a ESQUECÊ-LA na porta na hora da saída.

Pois bem, sonho ou realidade vou-lhes contar.

Chegada a hora da saída, batendo o sinal corri para o portão do colégio onde ficava lá a diretora levando-nos até o carro de nossos pais e nos dando adeus.

Não me lembro se isso era rotina, pois era muito pequena, então nesse dia a coisa parece ter ficado mais marcante da presença da diretora.

Lembro do parquinho e da área enorme que parecia um hotel fazenda a escola e lembro também poder ver o mar quando saía da escola, como morava na Urca, imagino que não era distante, pois não demorávamos a chegar a nossa casa.

Nesse dia então, estive olhando para um lado e para outro e nada de mamãe.

Passavasse muito tempo, noção ainda não tinha, pois não tinha relógio e nem sabia ver a hora.

Deveria ser do maternal, na época.

Eu sei bem que era já por do sol e nada da mamãe.

Não havia mais ninguém no colégio e a diretora não tinha conseguido entrar em contato com meus pais, então foi quando vi a diretora e minha professora (não sei bem, não lembro, mas era uma moça que eu gostava muito e tinha respeito, por isso achei) e a servente com mãos na nuca, na testa e caras de preocupação.

Então foi quando vi a diretora ligar para alguém e vir correndo para porta e ficar olhando direto e até que me chegava um táxi.

Fiquei tranqüila, pois achei que ela iria me acompanhar, mas logo depois fiquei meio tonta, senão iríamos no carro dela.

Fiquei com pânico, branca, gelada, assim a diretora encaminhou-me arrastada para o carro e perguntou se o táxi saberia chegar a minha rua, detalhe que eu não sabia, mas eu morava num lugar que todos conheciam na área, mas o "cara" não sabia, aí que comecei a suar frio e quase desmaiar.

A diretora me viu começar a chorar e falou brava, você tem que começar a saber ser mais independente, vá, ele está com endereço e qualquer problema você ajuda a ele indicando pelo menos o prédio, para alguma coisa você deve prestar, garotinha chorona e manhosa, além de me dar problemas durante o dia, pois seus colegas não gostam de você, você faz teatrinho para comover agente? Não adianta que eu já disse que não levo você, tenho minha vida.

Pronto, desabei mesmo.

Soluçava, gritava, mas de repente vi uma pessoa empurrando a cretina e vi, minha mãe me puxando assustada do táxi e falando para a dita cuja que nunca mais a filha dela pisaria naquele colégio, pois eu já estava tendo conflitos com a didática e orientação pedagógica deles e a minha educação rígida e meio proibitória.

E a diretora remeteu uns impropérios para minha mãe e só disso que me lembro.

Parece-me que ela ainda me levou para comer um hambúrguer que eu adorava do Rio Sul, ainda não tinha Mc Donnald´s nessa época, mas lembro do gosto desse sanduíche até hoje e do abraço forte no colo da mamãe.

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