Conheci Dr Ribas na gávea, Rio de Janeiro, na casa de meu avô.Eu
era ainda um nenê e o conheci desde o momento que me entendi por gente.
Era médico, alto e forte e com o rosto sério de quem não
era muito de brincadeiras. Na verdade era um introspectivo e muita gente confundia
timidez com antipatia. Era casado e só me dei conta disso quando uma
vez ele levou a mulher na casa de meu avô porque morava lá sozinho.
Todos tinham um respeito imenso por aquele homem tão pacato, dedicado
aos clientes e amigos e que nos fins de semana visitava sua mulher no sanatório.
Quando a vi fiquei encantada pela beleza extraordinária de seu rosto.
Sua figura delicada, seus modos aristocráticos e o carinho que imprimia
à conversa me conquistaram Tinham uma filha, Regina, da minha idade,
muito linda também, de olhos verdes e cabelos castanhos, minha companheira
de brincadeiras quando ia até lá. Eu não sabia, no entanto
onde morava Regina. Agora escrevendo esse pequeno depoimento é que me
dou conta que nunca soube de fato onde ela morava.
Muitas vezes, nos dias de sol, o Dr Ribas convidava a meninada da casa para
passeios originais seguido de almoços nos restaurantes preferidos. Mas
geralmente aderia aos grandes almoços na casa da Gávea onde se
reunia muita gente interessante.
Era uma figura solitária e amena e as pessoas simpatizavam com sua solidão
amistosa e triste. Falava muito da mulher Rafaela, e costumava contar sobre
sua doença nervosa e todos admiravam sua paciência e amor. Isso
eu absorvia nos intervalos que as crianças permaneciam entre os adultos
porque gostava de ouvi-los conversar, mas nem sempre podia ficar ali por determinações
dos adultos da casa.
Uma das desagradáveis surpresas que tive foi quando uma notícia
surgiu como uma avalanche, perturbando o carinho que o Doutor Ribas inspirava.
Não sei dizer como nem de que forma, meu avô ficou sabendo que
o Doutor Ribas utilizava sua credibilidade de médico para deixar a mulher
internada no sanatório e ainda orientava o tratamento.
Na época não compreendi bem exatamente o que queriam dizer, principalmente
porque apenas ouvia por alto o comentário. Mais tarde vim a saber o motivo
principal desse ato tão mesquinho. Era exatamente por causa de seu ciúme
doentio que perturbara sempre a vida de Rafaela. E ele convenceu-a de que ela
estava sendo vítima de problemas psiquiátricos.
Percebi quando os dois estavam juntos na casa de meu avô e depois quando
ambos foram morar com a filha na própria casa. Só muitos anos
depois vim a entender o ato maldoso, vítima da doença, na verdade
do próprio Dr Ribas que tinha feito Rafaela perder os melhores anos de
sua vida. Nunca esqueci do rosto circunspeto, humano e bondoso que transparecia
naquele homem culto e inteligente e meu avô aproveitou para dar a todos
nós uma lição de vida, falando do ciúme doentio
e que num caso desses exigia um tratamento urgente.