Nasci no asfalto, carro por todos os lados, barulho ensurdecedor, vida, movimento
e a praia a poucos passos de mim. Hoje estou aqui, a convite de amigos numa fazenda,
relativamente perto de Brasília. E ouço o canto dos pássaros,
o horizonte que se doira à medida que a manhã fica para trás
e o sol se intensifica, e escurecendo quando o dia vai morrendo, o sol se pondo.
Sento-me ali numa rede (que sempre me deixa um pouco tonta) no terraço
espaçoso, a contemplar de longe a natureza maravilhosa e me extasiar. Uma
sensação de tanta beleza que me aperta o coração e
ainda é mais um motivo para crer na existência de Deus.
Vejo crianças correndo, como se quisessem tirar o atraso do espaço
maravilhoso que os apartamentos não possuem, e vibrando nessa empreitada
de fazer parte do universo que se apresenta de mil maneiras.
E meu pensamento, então, toma dimensões variadas, atrasa-se para
imagens já passadas e adianta-se em sonhos futuros belos e felizes.
Pergunto-me se é permitido sonhar coisas tão especiais, quando vemos
atrocidades como essa, de uma filha planejar e matar os próprios pais com
requintes de maldade extrema. E os pais de Pedrinho terem sofrido dezesseis anos,
enquanto uma mulher tentava ser feliz, sabendo embora, que o faria por cima da
infelicidade de outras pessoas.
Mas a vida tem que continuar, rimos e choramos, apesar do que se desenrola à
nossa volta. Meu coração procurava absorver cada trecho daquele
paraíso de tranqüilidade e beleza. Recordei vários episódios
ali, enquanto "sentia" cada momento extraordinário.
Todos estavam em volta da piscina, mas eu tinha pedido para ficar um pouco ali
,enquanto captava os detalhes daquele lugar, e escrevia um poema.
Depois me passou pela cabeça quanta bondade, delicadeza e humanidade existem
na maioria das pessoas, e como eu já me emocionara em oportunidades várias
com essas demonstrações. Fechei os olhos deliciando-me com o cheiro
da natureza de que aquele lugar estava impregnado, com o silêncio, tão
raro para mim e com o fato de pertencer a esse planeta cujas emanações
me sensibilizavam tanto.
Foi quando vi muito longe uma criança de seus 10 anos que eu conhecera
na minha chegada, que me fazia sinal sorrindo e levantei-me para entender o que
ela queria. Pude perceber que andava com dificuldade, e um problema de falta de
coordenação motora tornava seus passos lentos e desordenados. Mas
isso não impedia que ele sorrisse enquanto tentava correr a seu modo e
me dissesse que eu o esperasse, porque ele queria ficar ali.
Esperei-o em pé, lamentando tudo que me desanimara antes, enquanto a criança
me dizia com dificuldade mas cheia de vibração.
- Já cansei de ficar na piscina. Queria ficar aqui. Estou tão feliz!
E abrançando-me completou:
- Gostei tanto de você!Podemos conversar?
Enquanto estendia minha mão para abraçá-lo, meus olhos se
umedeciam intensamente por aquele instante de felicidade inusitado e maravilhoso.