Muita gente em João Pessoa lembra dele. Ele tinha uma barraca na praia
de Tambaú chamada Padre Zé, que ficava embaixo de um pé
de castanholas quase centenário. Era ali que pessoas simples e até
da sociedade se espremiam para arranjar uma mesa e ficar ali olhando os barcos
ao sabor do caldinho de peixe de dona Socorro sua esposa. Passei dias maravilhosos
ali. Os meninos daqui de casa gostavam de lá, pois além do mar
calmo podia se divertir no Píer de Tambaú. 'Padre Zé' como
era chamado carinhosamente por todos, era metódico. Chegava cedo. Ia
as compras ali no mercado de peixe ao lado e escolhia a dedo os peixes, os crustáceos
que iria servir durante o dia. Era abusado. Não gostava de muita conversa
fiada e de gente chata.
Lembro-me como hoje quando ele todo feliz veio me contar que o Deputado Ricardo
Coutinho tinha aparecido por lá em Tambaú e numa reunião
tinha prometido resolver 'o mar de problemas' que a aquela região tinha.
E que ele confiava no futuro prefeito. Pois bem, veio o novo prefeito e as novas
ordens. Tinham que desocupar a área que ele havia trabalhado nos últimos
vinte anos. A ordem era sair dali e ir pro meio da praça. Até
resolverem onde as barracas seriam colocadas. Da última vez que nos vimos
tive um susto. Pois aquele 'Padre Zé' falante, comunicativo, cativante
no seu jeito de ser, tinha desaparecido quase por completo. Definhava a olhos
vistos
Queixou-se da falta de diálogo, dos arroubos da SEDURB, dos guardas municipais.
Disse-me que tinha perdido quase toda a sua freguesia. E que seu faturamento
caíra quase que 90%. Dona Socorro olhava a conversa e como sempre calada
só fazia balançar a cabeça como quem dizia: é tudo
verdade. E ele me perguntava o que ia fazer daquela forma, no meio do tempo,
parecendo mais um 'mangaeiro' em final de feira. Voltei por lá algumas
vezes. Não tinha mais como ficar na 'barraca' improvisada em frente ao
Mercado de Peixe fedorento. Nem tinha espaço e nem canto certo para consumir-mos
os produtos que tanto nos deleitaram nesses últimos anos.
Ontem voltei por lá. Fui ver a tal feirinha de Tambaú tão
decantada em prosa e verso por essa imprensa comprada de João Pessoa.
Ficou parecendo uma estação rodoviária do interior. Perdeu-se
aquele ar de Feirinha de Tambaú e agora parece mais uma praça
de alimentação de qualquer desses shoppings center da cidade.
Mas insisti na caminhada e deparei-me com as barraquinhas de artesanato jogadas
nas calçadas ao Deus dará. Os comerciantes estão esperando
a 'segunda etapa'. Mostraram-me a planta com os croquis de como vai ficar. Queixaram-se
do tamanho dos boxes (2x2) e do preço que ninguém sabe dizer quanto
é. Mas sem ter muito que fazer estão resignados a fazer tudo
como quer a PMJP. Mas ai a ficha caiu. E a 'barraca' de Padre Zé
foi parar aonde? Pois não conseguia vê-la onde a vi na última
vez que estive por lá.
No quiosque do Gaúcho procurei informação. E ele meio que
sem jeito me disse que Padre Zé tinha falecido há pelo menos uns
trinta dias. Que a barraca dele quase não funcionou - até por
falta de infra-estrutura mínima - e que ele foi ficando triste com aquela
situação e foi definhando. Ficou desgostoso com tudo aquilo e
no início deixou de ir. Só Dona Socorro continuava indo. Ele aparecia
uma vez ou outra. Mas nos últimos quinze dias não tinha ido mais.
Não via sentido ficar jogado ali no meio do tempo sem suas referências,
freguesia, amigos. A PMJP conseguira destruir o ânimo e os sonhos dele.
Morreu de tristeza, desânimo, abandono de todas as coisas que construiu
nos últimos vinte anos naquela beira de mar.
Mas o prefeito está certo. Tem que retirar aquelas barracas do meio do
tempo. É pena que 'Padre Zé' precisava de tão pouco para
continuar vivendo. Precisava apenas de respeito. E isso lhe faltou na hora que
mais precisou na vida. Mas isso também não vai sair na imprensa.
Principalmente nessa imprensa que só sabe elogiar uns e detratar outros.
Pobre Paraíba que trata os seus filhos e filhas como marginais. Basta
ver aquelas meninas de tão pouca idade se vendendo na beira mar de Manaira.
Basta ver o que restou de sonhos como o de Padre Zé, que a todos tratava
com carinho e respeito. Mas não deixaram ele trabalhar. Ele só
queria isso: continuar trabalhando.