Domingo, três de setembro. Ao amanhecer, a maior parte da Casa das Palmeiras,
obra reconhecida nacional e internacionalmente, fundada pela Dra. Nise da Silveira,
sofreu um incêndio que lhe consumiu quase toda a parte superior. Lá
estavam os ateliês de terapêutica artística e um acervo de
cinqüenta anos de desenhos, pinturas, gravuras, artesanato, biblioteca,
acervo este que serve de material de estudos e da evolução na
terapia de esquizofrênicos tratados com métodos atualmente modernos
mas pelos quais, durante mais de cinqüenta anos a Dra Nise da Silveira,
teve que lutar qual leoa. Não mais choques elétricos ou sedativos
cavalares com o paciente longe da família e, sim, uma terapia baseada
na atividade artística voluntária, acompanhada por especialistas
e do amor no sentido de recuperação da auto-estima destroçada
em algum momento das suas dolorosas vidas.
É uma perda irreparável, não apenas de valor material,
mas principalmente imaterial, porque de altíssimo valor psiquiátrico,
medicinal, antropológico e cultural. 50 Anos!... Segundo os bombeiros
há três pontos que indicam haver sido o incêndio induzido
criminosamente. A polícia também lá esteve, a imprensa,
e alguns amigos e dirigentes da Casa, este, todos voluntários. A Casa
das Palmeiras é uma instituição filantrópica sem
fins lucrativos. E nos últimos anos vem lutando com dificuldades. Durante
a vida da Dra. Nise mantinha-se graças à ajuda de artistas, empresários,
estatais e de doações particulares. Com a sua morte em finais
da década de 90, a luta continuou, porém mais difícil.
Se antes a Casa das Palmeiras precisava de alguma ajuda mas sobrevivia e cumpria
seu desiderato, hoje precisa ser refeita. Lá ou em outro lugar. Nós,
dirigentes voluntários, firmamos no domingo o compromisso de lutar por
isso. Haveremos de reiniciar tudo, agora sem 95 por cento do acervo e no momento
sendo obrigados a deixar os clientes sem o tratamento diário, nos moldes
a que estão acostumados, por falta de lugar enquanto se recupera praticamente
toda a parte superior, já que o acervo, este, desgraçadamente,
é cinza. É terrível ver cinqüenta anos de trabalho
transformar-se em cinzas por causa de um incêndio com características
de provocado. Revolta pensar: quem foi capaz de cometer tal perversidade? Por
quê? Para quê? Qual a motivação? Por certo a polícia
ajudará a esclarecer, pois até um coquetel "molotov"
foi encontrado dentro do que restou da Casa das Palmeiras.
Quando uma instituição de alto valor científico e humano
é destruída dessa maneira, a gente encontra mais um motivo para
aumentar as desilusões com a hora presente no Brasil (e no mundo). E
conclui que os verdadeiros enfermos estão é cá fora.
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