Vendo esta situação aparentemente sem solução do
Oriente Médio, que ameaça um mundo hoje interligado, e a brasileira,
igualmente assustadora, fico a pensar:
Cada opção humana está baseada em sentimentos fundos, alguns
dos quais insondáveis. Principalmente em relação à
política. Há causas externas, ideológicas e há causas
internas, psicológicas. As duas se cruzam e confundem. Ambas valem. E
ambas são capazes da perversidade.
Minha geração atravessou várias influências decisivas.
Em quarenta anos passou por dentro do marxismo; da mudança no Cristianismo;
da entrada do pensamento oriental no ocidente; da psicanálise e da revolução
tecnológico-científica. Da globalização. De armamentos
atômicos em 22 países. Varejada por essa concomitância de
revoluções (exteriores e interiores) minha geração
teve que digerir uma evolução e uma transformação
maiores que as vividas pela humanidade nos dois mil anos anteriores.
Ao longo dessa invasão de transformações concomitantes,
algumas pessoas foram cansando, desistindo ou escolhendo uma só via como
preferida. Outros, como eu, preferiram procurar compreender (e incorporar) os
aspectos complementares e os contraditórios de cada uma dessas revoluções.
Não é fácil questionar as (próprias) convicções
que se vão formando ao longo da vida e tendem a se cristalizar. Ser só
cristão, ou só marxista, ou só adepto do pensamento oriental,
ou só agente do progresso tecnológico ou só ver o ângulo
psicológico das questões é mais cômodo e mais fácil
que compreender em extensão e profundidade todas essas revoluções,
incorporando o resultado delas à própria vida, processo doloroso
e difícil, mas rico de ampla formação do homem integral.
Daí decorre a importância do neo-humanismo que brota de todas essas
experiências. O humanismo é o grande fator integrador porque dimensiona
a medida humana de todas essas revoluções. Ele une e fecunda partes
aparentemente contraditórias. Condiciona os desenvolvimentos materiais
e os espirituais ou subjetivos de nosso tempo, realizando, em suma, o metabolismo
da incorporação do que serve à vida individual ou coletiva:
deste metabolismo, derivam as democracias política, jurídica,
existencial e religiosa.
Hoje tombam as utopias do desenvolvimento material que encantaram o século
vinte, porém não cai o sentido de progresso inerente a ele. Em
vez de progredir, apenas, o desafio é compatibilizar progresso com a
felicidade, liberdade e justiça social. Há, portanto, um vetor
espiritual ao lado do material. É uma espiritualidade nova, uma subjetividade,
um valor imaterial, cultural.
Essa conciliação dolorosa entre atitudes que pareciam díspares
é o que caracteriza a visão neo-humanista deste começo
de século.
Varejado e fecundado por esse processo, uma homem de minha geração
precisa levar toda essa vivência para a política pois: se vivi
todas essas transições; se essas revoluções concomitantes
passaram por dentro de mim, fazendo efeito, e passei por dentro delas, indo
além; se enfrentei o impacto de tantas alterações, tenho
o dever de compreender o sedimento delas e aplicá-lo na luta pela democracia
que é o regime dentro do qual todas as experiências díspares
de um tempo histórico podem germinar e prosperar.
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