A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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Ode a Zidane onde há ódio ao Zidane

(Artur da Távola)

Zidane é zinedine, é zizou. Zidane é Z. Z de zás-trás e zás frente. O rosto é de águia, o bico, o olhar e o nariz, que, ao contrário, é ziran. Seu corpo vibra em Z. Corre em Z e relaxa a musculatura, enquanto os demais a contraem. Jogar para ele é um fardo, um dever. Um poema? Ajusta-se, antes, à forma pela qual o passe lhe chega. E, de imediato, se ajeita, domando a bola, servil, a seus pés. Zizou não é zonzo. Nem sonso

Zidane é viés. É diagonal, onipresente. É causa e não, efeito. É "zappeur", "zaouia", é "zazou" no jazz. Não ri. Não olha: vê. Encantador de bolas, como os há de cobras. É Zênite, é zeta, é zeugma da pelota. Rápido e ativo como Zéfiro, chuta zarabatanas no ponto zero. É Zen. Zidane é ziguezague inalcançável. Reto no caráter, oblíquo em campo, onipresente.

Em seu coração pulsa a brutalidade francesa na colonização da Argélia. Pulsam a indiferença e a frieza com que a Europa trata etnias emigrantes. E, além-mar, a brutalidade com que tratou, principalmente, os árabes, os armênios, os africanos e os povos orientais mais distantes. A própria equipe italiana, diferente das demais européias, era a única sem um jogador negro. Só brancos. Inclusive o racista que o ofendeu.

No inconsciente do craque dos craques, lateja a dor e a resistência de seu povo invadido, torturado, morto e oprimido no passado. Sim, Zidane traduziu a Frente de Libertação Nacional durante todos esses anos, na coreografia de suas jogadas imortais. É francês por acaso, apenas porque seus pais refugiaram-se em Marselha, logo de escapar da guerra devoradora de inocentes e pacifistas.

A cabeçada do dever cumprido foi a voz e a vez da resistência argelina. Gestual de guerreiro. Aquela cabeçada, traduzida, quer dizer o seguinte: cumpri meu dever com anos de trabalho incansável, plasticamente belo, original e único. Defendi o país onde nasci, cresci e respeito. Isto não exclui a inflexibilidade na manutenção da honra de meus ancestrais. Sua fé e seu sangue. Dela ninguém debocha!

Zidane é de zinco, é zodiacal, com ele neguinho não zoa. É zabro, é zambra, é zanga, azougue e zangaralhão. Mas sabe zanzar com a bola nos pés. É zaranza e é zarcão, é zopo e zorô. É zorra, é zorrague. É o zorro que surge de repente e faz o gol. Zidane zurze. É zote, zoteca e zotismo. Zidane é Zinedine, é zenocêntrico e é zorrague. Enfim, Zidane é Zoroastro. Por isso, através dele "Assim Falou Zaratustra", que nasceu no Azerbaijão.

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