A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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Um fio de esperança

(Artur da Távola)

Sim para o Telê bi-campeão mundial de clubes. Sim para o Telê preparador de duas das melhores seleções brasileira. Sim para o Telê disciplinador com suavidade e firmeza. Sim para o Telê cujos times não paravam de atacar fosse qual fosse o placar da partida até então. Sim para o Telê sem arrogância. Sim para o Telê caráter exemplar. Sim para o Telê mineiro que nunca perdeu seus hábitos de comidas saborosas e pão durismo simpático. Sim para o Tele correto chefe de família. Sim para o Telê que diante de seu caixão a baixar recebe as palavras que recebeu do filho. Sim para o Telê que passou por cima de paixões clubísticas e ao morrer foi homenageado pelo Brasil inteiro.

Assim são os homens de caráter. Vitórias e derrotas pela vida, sim. Não importa. Importa a dignidade. Importa a retidão de comportamento.

Desculpem a pretensão mas há um Telê que era só meu. Meu, não, do rapaz que fui. Quando se é jovem e a preferência clubística é uma paixão, há uma fase que se vai a qualquer canto para ver o time. Assim eu era, como qualquer garoto, com o Flu, que, aliás me honrou (porém não comunicou: li no jornal) incluindo-me entre os cem tricolores imortais, grande honra.

Pois este rapaz foi quem descobriu, para si mesmo, o jogador que era o Telê. Não impressionava. Não era ídolo daquele grande time de 51 mas era quem melhor assimilava a orientação desse modernizador tão criticado que foi Zezé Moreira. Telê foi o primeiro ponteiro, hoje ala, que jogava recuado e caindo para meia de ligação e ainda marcava. Era craque na frente e no meio de campo. Mas um craque diferente, magérrimo, sem jogadas sensacionais mas a maquininha que dava o ritmo ao time. Meus dois ídolos eram o zagueiro Píndaro e o ponta Telê isso sem falar no Castilho, que sem qualquer "tricolorice" em sessenta anos de amor e observação do futebol, foi o maior goleiro que vi jogar até hoje.

Este foi o meu Telê que as gerações dos anos de auge de seu sucesso não conheceram. Naquela época foi exibido um filme norte-americano de suspense terrível que representava a luta de um comandante para impedir a queda de um avião. Só havia um Fio de Esperança (este era o nome do filme) em determinada manobra desaconselhável pelo resto da equipe. Mas necessitava de coragem e decisão para tentá-lo por ser o mais improvável. O comandante decidiu, foi por ele e salvou o avião que já estava para se esborrachar. O filme foi um sucesso. Por isso, e quase ninguém noticiou, Telê passou a ser chamado o Fio de Esperança. O magrinho sempre dava um jeito de salvar o Fluminense na frente, em geral na undécima hora, enquanto São Castilho salvava lá atrás.

Este é o meu Telê . E é preciso ter vivido nesses anos para saber porque era o Fio de Esperança em um País que está a precisar de muita esperança.

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