Uns dias em Araras (Município de Petrópolis. RJ)
A natureza prepara o outono. Ainda há verão, porém, por
vir. O verão é psicótico! Tormentos, raios, calores brutais.
Desconfio que verão só foi bom ao tempo de garoto e de rapaz estudante
de faculdade: férias, amor para dar, nada de "trágicos deveres"
como diz\ia o poeta Cruz e Souza ("A vida presa a trágicos deveres").
Depois dos 'trágicos deveres' e do terno e gravata, sem praia de tarde
e tempo para vadiar, o verão torna-se a cada ano mais insuportável.
O tal aquecimento da calota polar. Até o sol que é vida, vira
vilão: dá câncer de pele. O verão é um treino
anual do apocalipse. Como treino é treino; e jogo é jogo... a
gente cá fica esperando que em matéria de apocalipse e de camada
de ozônio.o dia do jogo final não chegue tão cedo. O verão
é uma estação que precisa de psicanalista. Como os Governantes.
Hoje, 22 países já possuem armamentos atômicos.
Em Araras, estão discretos e deslumbrantes meus três pés
de Manacá, que já "vagalumearam" com o milagre de flores
de duas cores, roxo e branco no mesmo arbusto, fenômeno inexplicável
para nós poetas e talvez fácil de ser resolvido por botânicos.
E flores de cheiro suave como o de nuca da mulher amada. Também as reverberam
sibipirunas, em seu patriotismo do verde e amarelo. Também as Ipoméias
(ou "beijo de frade". Não é genial o nome?), Hibiscos
e algumas rosas. E elegante e exibido: ao abracadabrante beleza do Manacá
da Serra, em plena floração
Imperatrizes da serra, as quaresmeiras esplendem seus lilás pelo verde
generoso. Lilás ou roxo? Tanto faz. Roxo e lilás são primos
incestuosos. E lindos. Antigamente, via-se nas floristas uma flor roxa por nome
'saudade'. Nunca a esqueci. Sumiu. Como não sumiram minhas lembranças
da infância, quando minha mãe ao levar-me em visita aos túmulos
da filha e de meu pai, dizia: "- Era a flor preferida de seu pai."
O lilás é introvertido, modesto, mas nítido. Induz a reflexões
serenas sobre a vida (enquanto só é lilás) ou sobre a morte
(quando é roxo). Enfim, é uma cor de paz e filosófica,
a pintar a natureza deslumbrante deste Brasil arbóreo e floral antes
que a especulação o esculache ainda mais.
E por falar em roxo, a Ipoméia, que serpenteia como mato por cercas humildes
não sabe quão linda é. Vive a se esconder. Como certas
mulheres lindas e tímidas, de tanto serem olhadas.
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