A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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O Papa Bento e a inexistência do limbo

(Artur da Távola)

O limbo sempre me fascinou. O que seria? Como seria? Quando era criança e estudava o catecismo, ficava a imaginar um lugar sem frio nem calor, sem casas, mas flores e nuvens e uns anjos nenéns a esvoaçarem durante milênios, imponderáveis quais gaivotas contra o vento equilibrando-se na relação entre seu peso e a velocidade deste. Era lugar de silêncio, porém não de tédio. Os anjinhos brincavam de fazer xixi, não faziam cocô. E, mesmo sem saber falar, eles cantavam.

Esse era o limbo que fazia minha imaginação distrair-me das aulas de catecismo. (está se vendo...). Nem céu, nem inferno. Uma estação de repouso, logo abaixo do céu... Com os anos, abandonei a idéia de limbo pregada pela Igreja, porque me parecia cruel e sem sentido. Porém não abandonei a palavra. Lindíssima: limbo. Um som mozartiano para algo que não existia salvo como metáfora do nada. Uma vez, em rapaz, li no poeta Gibran, um verso dentro de poema que falava nas palavras que jazem no limbo do nosso entendimento. Achei genial. E volta e meia uso o termo limbo apenas de modo poético. Como será ser algo que não é? Nunca me respondi. Nem o assunto me preocupou.

Graças à cultura religiosa que o atual Papa vem demonstrando com o livro sobre Jesus e outros escritos, e aproveitando sua próxima visita ao Brasil onde já está começando a ser muito querido, comento, por isso, a decisão dele semana passada, no Vaticano, a proclamar que limbo não existe e nunca existiu. Era uma idéia errônea e teologicamente inconsistente, pois todas as crianças mortas ( e vivas, é claro), são anjos de Deus. Assim sendo, como admitir que, sem batismo, a alma da criança morta teria de ir para um limbo eterno? Que horror! Anjo de Deus vive na Graça de Deus, ora. Só acho que deveria existir limbo para adulto em vez de purgatório.....

Ao derrogar um erro de milênios, Bento 16 começa a dar indicações de modernização de certas crenças feitas para amealhar adeptos pelo medo. Sem limbo e sem pecado mortal inerente ao nascer (evidente absurdo), somos todos anjos de Deus.

Gostei deste Papa.

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