Antes do cinema e da televisão os atores, principalmente se cabeças
de companhia, podiam escolher o repertório. Este, constituía-se
numa definição artístico-polítco-ideológica
do ator. Havia autores preferidos pelas companhias teatrais que lhes encomendavam
obras. Os atores determinavam a escolha. Os autores escreviam para determinados
atores.
A industrialização do lazer cultural, a partir do cinema e depois
com a televisão, trouxe limitação para o ator quanto ao
seu repertório. O controle (doutrinário) das obras passou-se para
o sistema produtor, que escala os atores em função de variáveis
diversas entre as quais: preferência do mercado; a qualidade da emoção
já despertada pelo ator (empatia); o seu tipo físico, o talento
específico (para drama ou comédia); a disciplina profissional;
estilo e afinidades com a direção, autoria, produção,
etc. Em outras palavras: Não se escreve para o solo de grandes atores
mas para os interesses mercadológicos da emissora de tevê ou do
estúdio produtor do filme.
A partir do crescimento da indústria cultural (cinema primeiro e depois
a televisão) o ator desenvolveu, um processo de autodefesa, a partir
do qual inseriu novo elemento na composição do personagem: passou
a exercer, através deste, a sua visão de mundo. Tomou o personagem
de empréstimo para nele projetar os seus (dele, ator) valores, idéias
e a visão de mundo, impedidos de aparecer na escolha de um repertório
que não lhe compete mais e, sim, a quem produz as obras.
É comum a certa fase do estrelato o ator ou atriz rejeitar papéis
que o sistema lhe oferece. A partir de consolidação de sua posição
no mercado, visando a preservação de sua individualidade artística,
alguns atores e atrizes, suspendem (sem romper) o seu pacto com o sistema produtor.
Às vezes sobrevivem artisticamente e se liberam das regras implacáveis
da indústria, sempre atadas ao mercado e suas modas. Foi o caso de Ingrid
Bergman, Marlon Brando, Orson Welles. Outras vezes, o ator ou atriz, pairam
muito alto a ponto de se desligarem do sistema produtor (Greta Garbo) porém
estes quase não encontram regularidade na produção alternativa,
aquela que é, ou se pretende, puramente artística. Saem do auge
do sucesso para o vazio. E quando pretendem voltar para o sistema produtor,
este, com a vertiginosidade de seu processo, já encontrou sucessores.
Cruel processo. Mas real. O sistema combate quem a ele não cede. E destrói:
quem contra ele se coloca.
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