A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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Maldita bala perdida

(Artur da Távola)

Eras raridade, bala perdida. Hoje, tua torpe existência ceifa mais e mais e mais e mais vidas úteis e inocentes a cada dia. Maldita sejas, bala perdida, tão maldita quanto a bala que, não perdida, acha o seu destino. Assassina, maldito seja quem te fabrica, quem te venera, quem te vende e quem te detona.

Expressão corriqueira do noticiário da atualidade surges nas notícias sempre acompanhada dos efeitos perversos de tua trajetória. Crianças, velhos, pessoas em suas casas pobres, trabalhadores honrados, policiais em serviço, estudantes, vítimas são de tua sanha, bala perdida.

Marca de um tempo de delírio e aflição, de crime banalizado, de desamor e desvalorização da vida, és símbolo da crueldade dos fabricantes de armamentos e da estupidez de quem os usa, ainda que a pretexto de se defender. Cega, podes atingir a qualquer um, mas tens uma terrível preferência: os inocentes.

Maldita sejas, bala perdida ou achada bala, bala de qualquer calibre ou ambição, inimiga da vida, do amor e da fraternidade, expressão boçal das ilusões de poder. Que o tempo sobre ti se abata, varrendo tua mortal história de pavor, doença e morte moral. Que fiques como a recordação assombrada da loucura do poder; da maldição do dinheiro como fator de tragédia, e do crime como ilusão da grandeza.

Que tua falange de desgraças amaldiçoe os seus causadores e horror que disseminaste em tuas vítimas, não apenas as que morreram, mas as que ficaram com o berro de dor da perda de filhos, maridos, esposas, amigos, companheiros de trabalho. Que esta maldição ecoe através dos tempos, tornando infames todos os teus súditos e consumidores por toda a eternidade. Eles e todos os que contribuem para a tua existência, bala perdida, sórdida mensagem de dor e destruição. Vitória quase final da abominável indústria de armamentos.

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