A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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O bandolim

(Artur da Távola)

O conjunto regional nasceu da precária condição econômica de nosso povo, juntando os mais baratos instrumentos à venda e fabricados no País. Nas décadas de 20 e 30, os instrumentos de sopro eram importados e caros, não havendo no Brasil tecnologia em metalurgia para os fabricar. Por isso, a junção de instrumentos como violões (de seis e de sete cordas), cavaquinhos e bandolins de fabricação nacional, com alguma percussão portátil (pandeiro, eventualmente tumbadora), às vezes a flauta (esta, com tradição desde o início do choro como gênero) e, anos depois, o acordeão, compuseram o conjunto harmônico apto a solos e acompanhamentos. Já o piano não podia sair às ruas para serenatas e chorões. Ficou nos salões com Chiquinha Gonzaga e Ernesto Nazareth, dois gigantes.

A partir da década de 30, o rádio, necessitando de acompanhamento barato para cantores que se apresentavam ao vivo, preferiu o conjunto regional às orquestras, salvo em produções especiais para programas noturnos e consagrados, mesmo assim apenas nas emissoras principais. A base do acompanhamento era o conjunto regional, composto por violões, pandeiro, um cavaquinho ou bandolim, às vezes uma flauta. Jacob não gostava, aliás, da expressão "regional". E brilharam Canhoto, Rogério Guimarães, Benedito Lacerda e outros mestres..

A alta qualidade da arte de Jacob e Luperce Miranda retirou o bandolim da função subalterna e o trouxe à condição de solista privilegiado ou de principal instrumento de diálogo com o cantor solista. O mesmo se deu com Waldir Azevedo, ao cavaquinho, e com Garoto, ao violão. Tudo isso nos anos 50 do século passado.

O bandolim aparece no Brasil, trazido de Portugal, por volta de fins do século XVIII. Um século antes, aproximadamente, já era usado, em Veneza (onde o instrumento disseminou-se), por Vivaldi, ousado experimentador de novas sonoridades para a sua época. Não se sabe ao certo como vem parar no choro carioca, mas nos conjuntos dessa modalidade de música, o bandolim aparece aos poucos. Inicialmente veio o cavaquinho, instrumento de execução mais simples e sonoridade intensa. O bandolim, por possuir oito cordas agrupadas de duas em duas, formando, portanto, um conjunto de quatro cordas duplas, possui sonoridade mais doce e suave. Conforme o tratamento, porém, consegue o beliscado buliçoso, brincalhão, irônico, capaz de ombrear-se com seu sentido melancólico e plangente. Tal melancolia encontra limitações na dificuldade do prolongamento das notas ao bandolim, o que não impede grandes solistas de dele arrancarem sofrimentos e densidades. O instrumento é difícil, mas sua fala é direta, graças à sua base, o chamado "terno": flauta, violão e cavaquinho.

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