Estou cheio de ainda mais problemas e não sabia. Reconhecia alguns,
típicos desses quase setenta e um anos e triglicérides altos,
isso na qualidade de um idoso seminovo, vidros elétricos, ar de fábrica,
bancos reclináveis e pneus novos. Os demais, problemas com a melhor das
intenções o Presidente Lula me arranjou, num discurso aliás
de bom senso, há dois dias, quando disse que qualquer maior de sessenta
(e aludiu a si mesmo), se é de esquerda é porque está cheio
de problemas. Esquerda é para jovens. Ele mesmo aos sessenta, diz que
já foi de esquerda e hoje está "meio para social democrata".
Ora, eu sou de esquerda e aos quase 71 anos não me considero cheio de
problemas mentais, políticos ou radicais. Mas disso falo ao fim do artigo.
Então aos sessenta anos Lula descobre que a tendência natural é
avançar pelo centro com idéias de esquerda! Aconteceu o milagre!
E o reconheceu de público num discurso que passou em branco pelos principais
analistas de nossa imprensa.
Mas está na hora de dizer o que considero ser de esquerda.
Desde que terminei os anos de exílio na Bolívia e no Chile (consegui
sair de lá antes do regime Pinochet, por isso cá estou: poderia
ter sumido no meio daqueles crimes hediondos) aprendi que a verdadeira esquerda
não é o que eu pensava, como inchação do Estado
para distribuir a Justiça Social de modo eqüitativo, prevenção
contra a empresa privada e a idéia de que cada País deveria produzir
tudo o que necessita para sobreviver. Aprendi nas leituras e no amargo exílio
que a verdadeira esquerda é a democracia social ou social democracia.
Nada de o Estado impor o monopólio do pensamento, religião, padrões
estéticos ou ditaduras do proletariado ou de qualquer tipo. Aprendi que
a verdadeira esquerda é a posição de quem deseja a renovação
constante da sociedade; é generosa em seu comportamento; vive da democracia,
da substituição no poder e equilibra estado e iniciativa privada
num trabalho reitor feito pelos governos se possível dentro do sistema
parlamentarista.
Como diz Norberto Bobbio: "nem o estado máximo dos totalitários,
nem o estado mínimo dos liberais: mas o estado socialmente necessário".
E nesta esquerda democrática já milito há quarenta anos,
convencido de sua razoabilidade. Fico, portanto, feliz, ao ver o Presidente
Lula nesta grande revisão que está a fazer de sua vida e métodos
de governo, idem de idéias e pensamentos. Só falta agora o Presidente
aprofundar alguns conceitos para compreender melhor ainda que a verdadeira esquerda,
típica da maturidade pessoal, psicológica, espiritual e política
é a social democrática. Justamente aquela que a esquerda atrasada
adora ofender acoimando-a de neoliberal.E é a compreensão de que
no mundo moderno só a interdependência entre os povos garante a
plenitude da soberania de cada um.
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