A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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Os desumanos canaviais

(Artur da Távola)

Não é de hoje a exploração semi-escravagista que os usineiros impõem a um essencial serviço e que só pode ser feito à mão e facão: o corte da cana. É das mais dolorosas histórias da exploração do homem e da miséria pelo próprio homem.

O programa "Fantástico" deste domingo no quadro "Profissão Repórter" com Caco Barcelos no comando dos estagiários e direção de Marcel Souto Maior em reportagem de verdade (isto é, investigativa, sem demagogia, isenta de sensacionalismo e com fatos), esfregou na cara de milhões de brasileiros a vergonha representada, em pleno século 21, pelo que se faz com os cortadores de cana. O setor da cana de açúcar é dos mais rentáveis e o será cada vez mais, e as usinas continuam a tratar os trabalhadores manuais (como se isso fosse tarefa menor ou para escravos) com métodos quase medievais.

A reportagem registrou a tarefa com 7 meses de distância entre uma e outra abordagem televisual e colocou dois repórteres corajosos como cortadores de cana, um homem e uma mulher. O resultado é de estarrecer: cada campônio corta a média de sete toneladas de cana por dia! Houve tanto no ano passado como neste, 4 mortes (total 8) por exaustão! E segundo o texto, a morte não é considerada acidente de trabalho pelas empresas usineiras! Morreu danou-se... Uma das mulheres falecidas, Dona Maria Neusa Borges morreu com 25 quilos abaixo de seu peso normal. Uma vergonha!

Um erro apenas na matéria, aliás comum a todas as reportagens de TV tipo flagrantes: estas quase nunca dão o nome das empresas. Isso acontece também na reportagens em que a Polícia Federal dá injusta exclusividade à Globo: aparece o nome dos ladravazes e não dão os nomes dos corruptores. Se fala de alguém em hospital não dão - via de regra - o nome do mesmo. Se se trata de algo com restaurante também omitem o nome do mesmo. E isto se dá tanto quando a matéria é positiva como quando é negativa. Estas são razões ideológico-empresariais que a televisão já tem independência e autonomia para superar, porém não o faz. Minha outra dúvida não procede, eu mesmo acho: é se matéria com tal conteúdo humanista não se dilui no meio de tantas atrações levinhas e feitas para agradar como o Fantástico. Mas ainda assim, a denúncia deste programa deveria levar os homens do Governo que se diz de esquerda a uma outra política (a meu ver a cooperativista) com o ganancioso porque indispensável oligopólio que é o setor alcooleiro. Somente uma reorganização cooperativista acabaria com estas vergonhas.

De parabéns o Fantástico.

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