A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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Jô Soares cai no choro

(Artur da Távola)

Aconteceu um milagre aos primeiros minutos de ontem, quarta feira. O Jô Soares levou um conjunto de música brasileira, absolutamente fabuloso: uma clarinetista israelense supimpa; o chefe do grupo, um mestre no cavaquinho; um violão de sete cordas; um violão de seis; e um pandeirista, todos estes brasileiros. E que sonoridade!

Você precisava ver, menino! Esses músicos moram em NY e há cinco anos divulgam o choro brasileiro. O Conjunto tem um nome semi-internacional. Vá lá: "Choro Ensemble". É sensacional.

O chorinho vai ser o próximo boom de música brasileira no exterior. O Hamilton de Hollanda e vários outros instrumentistas patrícios já o comprovam em suas aventuras internacionais.

Mas o alegre milagre foi o Jô abrir espaço para a música brasileira. Em seu programa, com raríssimas exceções (a Beth Carvalho, por exemplo), só aparecem aquelas insuportáveis bandas de rock, com tipos sempre iguais, ritmos alheios aos nossos, cabeleiras caspentas, ar de rebelde sem causa, repetitivos como música, contando sempre as mesmas superficialidades, e tatuagens a granel. Ao tocar fazem aqueles mesmos gestos de jogar a cabeça para trás, o corpo para frente e cara de quem sofre de hemorróidas, daquelas insuportavelmente dolorosas em que, por engano, em vez da pomada adequada, passaram Vick-Vaporub. Supõem-se moderníssimos e são conservadores, pois, há trinta anos, se faz essa espécie de sociologia do desespero e da feiúra como suposto protesto e a chamam de música.

O Jô Soares é pessoa culta, Q.I. acima do normal, profissional de grandes serviços às artes cênicas brasileiras. . Jô é brasileiro até no cerne em seu humor e na abordagem de seus livros. Mas sua formação musical é norte-americana, apesar de haver estudado na Suíça, e se tornado um grande ator no Brasil. Até o programa de rádio que fazia era sobre blues.

Em seu programa ora noturno ora madrugadino, até o sexteto simpatiquérrimo, quando marca a entrada de algum entrevistado é com música ou, quando não, com ritmo norte-americano. Ora, o Brasil vive, desde a bossa nova até hoje, em vários estilos e formas, um auge instrumental de altíssima qualidade, aberto a influências, não-sectário, mas ao mesmo tempo brasileiríssimo. Esses instrumentistas raramente têm espaço na mídia e muito menos no programa do Jô (nem no de Serginho Groissmann).

Por isso, a presença de um grupo de choro pode ser considerada um milagre. Mas aposto que só foi chamado, porque não toca no Brasil...

Entrementes, no referido programa, o Governador Cláudio Lembo deu um show de simpatia, bom humor e raciocínio tão rápido quanto o do Jô, surpreendendo-o.

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