Costuma-se dizer: Quem ama não mata. Em tese concordo. Observo, contudo,
que o amor doente pode matar. Nem que seja em pensamento, ou projetando setas
de malignidade com ondas mentais. Atingirá o objetivo? Pode ser. Mas,
raramente.
Prefiro ir por outro caminho, e afirmo: Quem ama não mata, nem trata
mal. Tratar mal corresponde a desamar. Isto é comum em uniões
belicosas que, entretanto, não conseguem a separação, ou
não precisam dela. Subsistem a duras penas.
Tratar mal é um tipo de semi-assassinato bem mais comum e corrente do
que matar. Com uma diferença. O ofendido ou a ofendida fica doendo e
doendo. E o ofensor se julga repleto de razões. Machuca, até mesmo
quando tem razão. O verdadeiro amor trata bem. Quanta gente não
trata mal, porém também não trata bem
È tarefa para heróis e heroínas do afeto isso de conviverem
por muito tempo, sem projetar os seus momentos de humor transtornado em mau
trato para o/a companheira. Uma frase; uma resposta mal sucedida ou momento
de nervosismo, de pergunta ou afirmação que contenha setas de
agressão (oculta ou às claras); um modo de falar que faz a outra
pessoa sentir-se julgada idiota; uma frase fatal, ou uma inflexão raivosa,
eu dizia, detona bombas da mais destruidora dinamite guardadas e dissimuladas.
Tratar bem é uma arte, até mesmo para quem convive sem amar. Simples
e até lugar comum: ninguém gosta de ser maltratado. Existe também
um tratar mal mental, às falado na intimidade ou amigos. Este é
perigoso. Pois nos transformamos aos poucos no que falamos e no que pensamos.
Este tipo de "falar mal" volta-se para quem o alimenta.
Há muitos anos, filha de amigo meu ensinou-me, ela criança e eu
adulto, o seguinte: o pai reclamara dela, a ralhar, como se dizia antigamente.
Ela chorou. Ele se comoveu e disse:
"-Mas, minha filha, papai gosta tanto de você. Falo para o seu bem."
Ela, na tampa, contestou: "-Eu sei, papai, que você gosta de mim,
mas você não gosta do jeito que eu gosto de ser gostada."
Pronto! Aí está tudo o que eu queria dizer e já ia levando
mais que o espaço de uma crônica para fazê-lo.
Que tal comprar um livro de Artur da Távola? O Jugo das Palavras |