Os grandes pensadores da humanidade, em todos os tempos,vêm tentando responder
a três perguntas que qualquer homem se faz um dia ou outro:
Quem sou? De onde vim? Pra onde vou?
Já eu, poetinha tupiniquim, por força do oficio e da curiosidade
alheia,venho tropeçando em três perguntinhas o tempo todo:
O que é poeta? O que é poesia? Pra que serve a poesia?
E só agora, depois de muitos livros editados e muitos quilômetros
rodados, posso responder em definitivo,a vocês, senhoritas e rapazes aqui
presentes:
Eu não sei o que é poeta.
Não sei o que é poesia.
E também não sei pra que serve a poesia.
Quando eu era menino, precoce em leitura e débil mental em matemática,
conseguia botar uma frase em baixo da outra,chamava aquilo de poesia e o autor
de poeta. Tinha coragem de mostrar os versos pra namorada, mas para os amigos
não: no interior poesia cheirava coisa de bicha.
Aos poucos, melhorando um pouquinho o que escrevia e o que vivia, fui descobrindo
outros poetas, alguns por biografias,outros ao vivo e em cores.
Poetas geniais no texto e medíocres na vida.
Poetas medíocres no texto e geniais na vida.
Por exemplo: hoje eu vejo lampião,o cangaceiro,como um grande poeta.
Que não deixou nada escrito,mas interpretou na prática um belo
poema épico da revolta humana. Ele sentia diante da injustiça.
Agora, literalmente,poeta é todo aquele que faz poesia e ponto final.
Uma coisa eu sei:quanto mais você se lambuza de vida,mais fácil
fica você reconhecer um poeta quando dá de cara com um. Porque
poeta que é poeta nem sempre fica só metendo os peitos em versos.
Ás vezes vai fundo no que sente e se esquece de passar pro papel.
Onde é que eu estava mesmo?
Lembrei: na segunda pergunta:o que é poesia.
Em minhas primeiras loucuras escritas, poesia era uma coisa de macaquito. Eu
queria imitar as poesias que lia. Não me preocupava com clareza,com quase
nada. Se as palavras me pareciam bonitas eu tacava lá e pronto.
Depois complicou tudo.
Porque poesia e amor são assim uma espécie de vício.
Quanto mais você experimenta, mais você quer. E mais exigente você
fica.
O mais fantástico da poesia,seu charme,é que ela pode ser tudo.
E pode ser de todas as formas.por exemplo: há mil anos que se fazem poemas
de amor. No entanto, cada poeta faz poesia de amor de um jeito. A poesia tem
a capacidade de cantar o mesmo sentimento de forma sempre diferente.
E vale tudo: até mesmo não usar palavras.
Valem números, vídeo, símbolos, letras, o escambau.
Agora, devagar com o andor que o santo da poesia é de barro. Vacilou,
a poesia cai e quebra a cara. O compromisso com a beleza é inevitável,
e isso não se resolve só com palavras bonitinhas. Está
cheio de poesia por ai perfeita do ponto de vista de construção
literária, cujo ritmo é uma droga.
Ou o ritmo é bom e o conteúdo idiota.
A grande dificuldade da poesia é justamente sua facilidade. Fazer poesia,
qualquer um pode. Conseguir fazer um bom poema já é outra história.
Este livro me custou um ano de escrever. Fui tão exigente que mostrei
os poemas a um monte de jovens. Os que eles não gostaram eu rasguei e
comecei de novo. Mesmo assim,minha pretensão é de ter conseguido
meia dúzia de poemas bons, apaixonantes. No máximo.
Gosto de poemas curtos e grossos. Diretos. Enxutos.
Mas pelo amor de deus não peguem isso como regra da poesia. Não
tenham medo de não gostar. E principalmente não tenham medo de
se entregar a ela. Igual a vida, a poesia bate forte em coração
e cabeças abertas.
Quanto a questão de pra que serve a poesia, se cair no vestibular vai
todo mundo levar pau. Todas as opções assinaladas com x estarão
certas. E todas estarão erradas.
Poesia serve tanto para protestar contra a guerra, como para enaltecer o espírito
de luta. Mas não vou ficar dando exemplos dos outros, que é covardia.
Vou falar de mim, que se errar vai por conta da vaidade, se acertar vai por
conta da modéstia.
Já quis que a poesia servisse pra conquistar garotas.
Como paquera deu certo,mas o resultado poético foi caretíssimo.
Os melhores poemas de amor fiz sem esperar nada da poesia.
Também já quis ficar famoso com a poesia. E assinei contrato com
a TV Globo para usar poemas meus em suas novelas. Conseqüência: todo
mundo acha até hoje que os poemas das novelas eram dos próprios
personagens.
Durante a ditadura de 1964 para cá, quis que a poesia servisse para derrubar
os poderosos de plantão. Seria uma inverdade história afirmar
que eles caíram por isso.
Nos últimos anos, tenho usado a poesia para deter as usinas nucleares,
para fazer as pessoas se tocarem corporalmente, e até para ganhar um
dinheirinho, que a crise não poupa nem mesmo os poetas.
As usinas continuam se multiplicando, as pessoas continuam olhando os outros
de longe, e o lucro liquido que tive com poesia foi tão pouco que bebi
ele todinho em dois chopes.
Mas pra uma coisa a poesia talvez sirva, sim.
Para fazer a cabeça de quem a pratica. E fazer a cabeça de quem
lê.
Afinal de contas, é até bom que a poesia não sirva pra
nada. Igual ás flores,que você pode até plantar em canteiros
e achar lindo,mas que não nasceram pra canteiros. Nascer é problema
da flor. Fazer canteiros é problema seu.
Igualzinho a este papo aqui. Porque, se os poemas que você vai ler ai
na frente não disserem nada de bom, todo este lero terá sido um
blá-blá-blá que você só decora pra passar
na prova e esquece.
Ah, sim: me faz esse favor. Não leia este livro apenas por obrigação.
Poesia está mais pra lição de vida que pra lição
de casa.