A palavra pleonasmo não é popular, e muita gente nem sabe ao
menos o que significa. Pleonasmo é uma figura de linguagem, a palavra
é de origem grega e significa redundância de termos, o exagero,
a superabundância. E apesar de muitas pessoas ignorarem a sua definição
ela está na boca do povo, e como diria um professor meu o pleonasmo "está
na pragmática". Basta uma olhada rápida para as conversas
do dia-a-dia, seja no bar, na biblioteca, no escurinho do cinema, no ponto de
ônibus. Nem em entrevista para conseguir um emprego o pleonasmo dá
sossego, aí é que ele aparece mais porque é o momento em
que queremos impressionar e esquecemos de nos policiarmos.
Um anúncio de jornal oferece uma ótima oportunidade para um grande
cargo em uma conceitua empresa, você então rapidamente se candidata
para a vaga e marca uma entrevista com o executivo da empresa e frente a frente
com seu futuro chefe vai fazer de tudo para causar uma boa impressão,
afinal a primeira impressão é a que fica.
- O que você pretende contribuir com a empresa se for contratado? - Pergunta
o seu futuro chefe.
- Pretendo trabalhar muito na filial em Belo Horizonte e ampliar enormemente
as vendas em conseqüência ao alto faturamento criar novos empregos.
- Você responde eloqüentemente
- Infelizmente você não serve para a nossa empresa, o seu perfil
vem de encontro ao que estamos esperando, você se sairia melhor em um
circo.
- Como assim, você está me chamando de palhaço? - Você
responde indignado.
- não me entenda mal, o seu perfil é muito mais para mágico
do que para palhaço.
- ainda não consigo entender.
- Ora bolas! Alguém consegue criar algo velho?
Que baita injustiça ser preterido em favor do pleonasmo. Por isso devemos
estar atentos em todos os momentos.
Quero tomar a liberdade e ajudá-lo(a) com algumas dicas que serão
importantes para evitarem situações como esta.
No seu habitat natural tente ser cercado por muitos livros e sempre que for
necessário recorra ao dicionário. Ops! acho que cometi uma gafe
todo habitat é natural. Desculpe-me por esta falha, mas vamos seguir
com as orientações. Como o mundo está globalizado e as
pessoas estão mais próximas umas das outras estamos enfrentando
um grande fenômeno, ou melhor, a febre de convivermos juntos. Agora surgiu
uma grande dúvida. É possível conviver separadamente? Não
desanime se o pleonasmo está tentando atrapalhar a sua vida. Não
dê bola para ele pense no seu futuro imagine-se recebendo o Oscar e naquela
cerimônia maravilhosa de entrega você frente a frente com miríades
de pessoas quiçá milhões, com o microfone em punho discursando:
"Agora que estou famoso(a) escreverei minha autobiografia muito em breve".
E se algum engraçadinho quiser estragar o seu discurso dizendo que se
é autobiografia, já é sua e não pode ser de outro.
Não fique triste mantenha a posse e siga em frente no seu maravilhoso
discurso, mantenha o sorriso nos lábios, porque afinal de contas você
não é contorcionista para sorrir com o umbigo, ou é?
Olhe para frente e tente sair pela tangente homenageando a sua bela mulher,
faça uma sessão nostálgica e conte para o público
como você a conheceu e como era romântico, fale daquela noite em
que vocês estavam a sós debaixo de uma árvore e você
como poeta nato que é versejou para ela " olha amor como hoje a
noite está bonita e como reluzem as estrelas do céu" ela
estará tão apaixonada que não perceberá que só
podem existir estrelas no céu. Fique com os olhos fixos na platéia
e se por ventura estiver presente alguma autoridade você também
pode homenageá-los "obrigado pela presença do senhor general
do exército, do senhor brigadeiro da aeronáutica, do senhor almirante
da marinha". Afinal quem vai prestar atenção no detalhe que
só existem generais no exército, brigadeiros da aeronáutica,
e almirantes da marinha? Afinal errar é humano e falhas como estas são
apenas pequenos detalhes; poucas pessoas imaginam que detalhes só podem
ser pequenos. Nem o Roberto Carlos imaginou quando cantou " detalhes tão
pequenos de nós dois". Quando as coisas não estão
dando muito certo é melhor que você pegue o seu boné e vá
para casa, reflita e não fique deprimido, afinal você não
tropeçou usando aqueles pleonasmos absurdos e clássicos, subir
pra cima, descer pra baixo, entrar pra dentro, sair para fora. E você
não é o único ser humano a cometer tamanhas falhas.
Imagine que um rapaz muito tímido vai pedir a mão da mocinha lá
no interior da Bahia, e o pai da moça é um coronel muito bravo.
O rapaz de terno e gravata tremendo muito, o pai da moça com pose de
macho e uma voz muito grave querendo saber das intenções do rapaz
com a sua filha faz a seguinte pergunta:
"Quais são os seus planos ou projetos para o futuro?"
Com certeza o rapaz tem que se conter muito para não cair em uma gargalhada
muito grande porque no seu íntimo ele tem vontade de perguntar:
"O senhor conhece alguém que faz planos para o passado?"
E afinal em qualquer profissão é possível cometer erros
com o danado do pleonasmo. Pense no treinador da seleção brasileira
depois de vencer seis jogos seguidos e quando o time chega na final ele diz
emocionado para todos os jornalistas
"Vou manter o mesmo time para a final"
Ele fala com toda autoridade porque sabe que nem passa pela cabeça do
técnico adversário que não se pode manter um outro time.
Até os nossos embaixadores também contribuem para o pleonasmo
nosso de cada dia, quando estão em algum país e tem a oportunidade
para discursarem e defenderem os interesses do Brasil gritam aos quatro cantos
"O Brasil é grande entre os grandes países do mundo".
Afinal de contas ele é muito ocupado pra saber que os países só
podem ser do mundo ou podem ser de outro lugar? Até as grandes agências
de propagandas querendo fazer um comercial que prenda a atenção
do telespectador, ouvinte, também tropeçam e divulgam o seguinte
comercial:
"Na compra de um travesseiro azul você ganha outro inteiramente grátis
na cor que você quiser".
Afinal de contas o telespectador quer é ganhar e ele com certeza não
conhece ninguém que ganhou pagando. Até mesmo os religiosos quando
são invadidos por uma grande emoção cometem falhas. Um
certo dia um religioso estava dizendo algumas palavras em um velório
e querendo exaltar a viúva exclamou:
"A Dona Mariana está há muito tempo conosco em nossa comunidade,
e sou testemunha da sua dedicação, apreço, e carinho que
tem dispensado a nós; por isso neste momento de consternação
em que se tornou viúva do falecido Joaquim Neto Paes ela merece todo
o nosso amor e carinho". Afinal de contas o povo está emocionado
demais para se preocupar que até que se prove o contrário, não
pode haver viúva se não houver um falecido. Até o Sir Caetano
Veloso que é um perfeccionista e se preocupa em exaltar a língua
portuguesa em suas canções também já foi traído
pelo pleonasmo, certa vez cantando emocionado para uma grande platéia
soltou esta: "eu tenho meus segredos e planos secretos".
Enfim querido(a) que me lê, não fique entristecido e não
perca suas noites de sono. Lembre-se: você não é o único,
continue sua vida com tranqüilidade, saia para rua e encare a vida de frente
porque afinal de contas até onde sei, você não conseguirá
encarar a vida de costas ou de lado. Pleonasmo, eufemismo, catacrese, metáfora,
metonímia e tantas outras fazem parte do nosso dia, basta termos coragem
e sabedoria para conviver com elas, e se por ventura um engraçadinho
ficar irritado com você porque tropeça algumas vezes, e com toda
certeza tropeçará, e te mandar calar a boca, não fique
irritado nem tente agredi-lo, apenas faça o que ele te pede porque afinal
de contas o que mais você pode calar?
Depois de todas estas dicas acredito que você já pode se considerar
um perito em pleonasmos de cada dia. Então vamos fazer um pequeno teste.
Pense um pouco e em seguida responda. Qual outro pleonasmo é tão
comum? "Já sei", diria você. "O pleonasmo mais comum
é o voltar para trás", e acrescentaria eloqüentemente
"afinal de contas ninguém pode voltar para frente". Mas infelizmente
nem tudo pode ser do jeito que a gente gostaria que fosse. Numa rápida
olhada na gramática verificaremos que voltar pra trás não
é pleonasmo. Então volte atrás e reconsidere sobre o fatídico
pleonasmo.