A Garganta da Serpente
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Que coisa é ser Poeta

(Marcial Salaverry)

Poetas sempre foram tidos e havidos como pessoas que vivem alienadas do mundo, apenas pensando em coisas etéreas. Isso talvez tenha sido em priscas eras, porque agora, poetas são pessoas totalmente inseridas no contexto, que participam ativamente de todos os movimentos sociais. Apenas um detalhe. Suas armas são a caneta e papel e, atualmente, um teclado de computador.

Recebi uma frase, escrita por um dos grandes mestres das letras, José de Alencar, que expressa bem o que é SER POETA. Vejam só...

O cidadão é o poeta do direito e da justiça; o poeta é o cidadão do belo e da arte.

Antes de mais nada, ser poeta, é um estado de espírito. Quem é poeta, o é internamente. Tem a poesia na alma. Falamos "poeta", mas normalmente estamos nos referindo a todo aquele (ou aquela... aliás, o termo POETA, se aplica tanto "aos", como "às") que tem aquele dom natural para as artes escritas.

Pode-se aperfeiçoar a arte da escrita, seja através de estudos, desenvolvendo toda uma técnica, seja através da prática, escrevendo cotidianamente. Aliás, quanto mais se escreve, mais se desenvolve um estilo próprio, e melhor se escreve, pois vamos corrigindo defeitos (ou mesmo os aperfeiçoando, eis que, muitas vezes um defeito acaba se transformando em qualidade...).

Existe uma certa polêmica que tenho visto na Internet, onde alguns puristas das artes poetais criticam acerbamente os poetas que simplesmente libertam seu interior, escrevendo o que lhes vai na alma, sem qualquer preocupação quanto aos detalhes técnicos, tão ferrenhamente defendidos pelos ditos puristas.

Ora, qualquer julgamento que se faça, sempre será algo pessoal. É íntimo de cada qual. Se não gostamos do que determinados poetas escrevem, será suficiente não mais os lermos. Daí, passar para ataques pessoais, publicando críticas azedas quanto à qualidade artística do que este ou aquele poeta escreveu, vai uma distância enorme, porque, se os escritos desse poeta não lhes agradam, certamente agradarão a muitas outras pessoas.

Atualmente, não existe mais aquela preocupação de antigamente quanto aos detalhes técnicos da poesia. Métrica, e mesmo a rima não mais são exigíveis. A grande maioria do "público consumidor" das artes escritas, prefere ver o sentimento, a alma de quem escreve, transcrita para o papel.

Meus amigos puristas devem reconhecer que, muitas vezes, em benefício da perfeição técnica, sacrifica-se a perfeição anímica.

Para encontrar um termo que se enquadre melhor na métrica, ou mesmo na rima perfeita, precisamos consultar um dicionário, e isso tira um pouco da real inspiração poetal.

Lembro aos puristas que, mesmo em priscas eras, já havia o termo "licença poética", para justificar eventuais deslizes técnicos de nossos grandes escritores do passado.

Portanto, mais um lembrete aos nossos tão preocupados puristas, como está na mensagem de nosso mestre José de Alencar, escritor de técnica irretocável: "o poeta é o cidadão do belo e da arte"..., Então, em nome da beleza da arte, a alma tem que trabalhar liberta, sem se prender aos grilhões da perfeição técnica, que tolherá sua criatividade.

A poesia é uma criação da alma poetal que todos temos em nosso interior. Basta que a deixemos fluir livremente. Existem muitos poetas que mantém maravilhas engavetadas, simplesmente porque as acham bobas, piegas, ou porque algum "iluminado" fez alguma crítica azeda quando leu aquele escrito.

Não tenham dúvidas, crianças, da mesma maneira que sempre existe algum pé cansado que se adapte a um chinelo velho, sempre haverá alguém cuja sensibilidade se afine com a sua, e que irá aplaudir sua poesia. Tenho lido verdadeiras preciosidades escritas por pessoas que se julgavam inábeis para as artes escritas. E as tenho estimulado para desenvolver sua alma poetal.

Escreve poeta, sem se preocupar em agradar este ou aquele. Liberte sua alma, simplesmente. Solte a criatividade que lhe habita o espírito. Para cada um que não aprecie seu escrito, não tenha dúvida de que haverá um outro que lhe achará um gênio.

Da mesma maneira que os poetas tem seu jeito de sentir e escrever, os leitores tem sua maneira de ler e sentir. A diferença é exatamente essa, quem escreve, primeiro sente o que lhe vai na alma, e transpõe esse sentimento para o papel (ou telinha). Quem lê, percorre o caminho contrário, ou seja, primeiro lê o que tem diante dos olhos, e depois vai analisar o efeito que o escrito provocou em sua alma. E aí está a diferença. Nem todos tem o mesmo sentir.

Portanto, tanto aos críticos quanto aos poetas, sugiro um cordial aperto de mão, um abraço fraterno, e que haja respeito mútuo nessa história. Vamos desarmar os espíritos, para que todos tenhamos UM LINDO DIA.

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