Dominar a versátil forma de expressão que é a escrita constitui
uma benesse ao alcance de apenas alguns. Ao contrário de outras artes,
a escrita pode exprimir de forma inequívoca as ideias e as opiniões
de cada um, sem necessitar de retoques ou de simbolismos. Sem obrigar o leitor
a um esforço de interpretação. Pão, pão, queijo,
queijo, como dizemos em Portugal.
Como as outras artes, a escrita pode buscar a beleza, a simbologia, a imagem distorcida
e outros floreados para se justificar enquanto expressão artística.
Porém, existem enquadramentos próprios para esses devaneios. Como
a poesia, o romance ou a ficção.
A crónica, pelo contrário, como o artigo, a notícia ou outra
prosa de pendor mais jornalístico, presume uma abordagem directa e frontal
ao tema, ainda que deixe maior margem de manobra para retoques de estilo individual.
Isso, todavia, não lhe subtrai um cariz mais informativo e alguma exigência
de rigor.
Sempre que um cronista escreve deve levar em conta o objectivo final da sua prosa,
considerando a legítima expectativa dos potenciais leitores, e apelar à
sensatez para não transformar uma crónica num arremedo panfletário
e irresponsável. Ignorar o possível impacto do que se diz nas consciências
dos destinatários finais, cuja permeabilidade se desconhece à priori,
é como permitir a uma criança que brinque com fósforos: ninguém
controla a dimensão do fogo que pode atear-se dessa maneira.
A sensatez assume-se por inerência como um critério fundamental para
o cronista que publica as suas matérias. Uma crónica não
equivale a um desabafo que se tem à mesa do café, é um instrumento
de formação de mentalidades que requer um mínimo de ponderação.
O recurso a um tom extremado, a despropósito, ainda que reflita a opinião
genuína do respectivo autor, é uma leviandade sem perdão.
No pior dos casos, pode conduzir a excessos por parte de pessoas mais influenciáveis
e constituir assim a acha para uma fogueira que a infantilidade de quem escreve
não consegue justificar. E não se compadece de boas intenções.
É coisa séria e deve ser respeitada nessa condição.
Saber escrever, ao contrário do que creêm alguns "arrumadores
de palavras", engloba o respeito pela forma, pelo conteúdo e acima
de tudo pelos receptores anónimos e indistintos do que se diz. Liberdade
de expressão das ideias não significa libertinagem de propagação
das asneiras.
Assuntos melindrosos requerem subtileza e contenção, no contexto
de uma crónica criada sob esse estatuto e publicada nessa condição.
Para os berros pseudo-doutrinários existem enquadramentos e meios de divulgação
específicos e a anarquia não tem lugar nestes moldes da escrita
para o leitor comum.
Esquecer estes pressupostos é fazer tábua rasa das regras mais elementares
a que se deve subordinar um cronista. É abusar de um instrumento que não
se destina, por princípio, ao livre arbítrio de quem se arvora de
pedagogo e se fantasia de escritor.