Houve momentos em que Vinícius de Morais fez poesia legível.
Se não inovadora - o que nunca parece ter sido a intenção
-, em conformidade com o rigor qualitativo de alguns grandes poetas contemporâneos
dele.
No caso de Carlos Drummond, por mais que este tenha "furtado a Vinícius/sua
mais límpida elegia", dele Vinícius parece ter tirado muito
mais que lirismo em pureza clássica.
Tomemos como exemplo de análise "A rosa de Hiroshima" (in "Poesia
completa e prosa", Aguiar, 1974) de Vinícius de Morais. Por mais
que a autoria prove o contrário, tomo esse poema como um exemplo ótimo
de estudo da obra de Carlos Drummond de Andrade.
Longe da mística, da metafísica, do lirismo cortante ou mesmo
do machismo viniciano, a "rosa" transpõe aos sentidos toda
a perplexidade subjetiva e anti-retórica condicionada pelo comedimento
- claro na gradação dos últimos versos: "(...)Sem
cor sem perfume/Sem rosa sem nada" -, além da a temática
engajada, do estilo de Drummond (ver. "A rosa do povo", Record, 1945).
A coisificação que a palavra "rosa" adquire no poema,
um aspecto definido por Haroldo de Campos como carnatura da palavra, é
outra amostra desse estilo, em que "rosa" torna-se a representação
de um objeto mnemônico, quase palpável e oposto ao sentido de bomba
atômica.
Temos também a utilização de uma medida mais popular, a
redondilha, e uma coloquialidade imperativa, em contraponto ao costumeiro subjetivismo
oral de Vinícius, além da concisão, que dá o charme
dos versos, tornando-os bem resolvidos, uma marca de Drummond, na escolha de
termos como "cálidas", "hereditárias", etc.
Não bastasse, nesse poema, o autor atingiu um estilo de ressignificação
através do espantamento pela simplicidade na escolha das palavras e do
jogo de idéias do poema na interposição constante de imperativas
e adjetivações, verso a verso: "Pensem nas crianças/Mudas
telepáticas/Pensem nas meninas/Cegas inexatas(...)".
Enfim, Vinícius produziu pedras-de-toque, versos memoráveis, mas
sobriamente pouca originalidade. Vejo-o como um aprendiz/garoto-propaganda da
geração de 1945, como Arnaldo Antunes o é para os concretistas.
Ambos, poetas menores que donos mais de uma vida ativamente poética e
menos de uma poesia ativamente viva, encontraram na música popular um
instrumento de divulgação da poesia formal brasileira. Eis a contribuição.