Confesso, caro leitor, que relutei em escrever algo sobre o filme Tropa de
Elite, estava meio confuso. Todos os meus alunos assistiram a ele, com raríssimas
exceções, mas viram o filme como se estivessem assistindo ao Máquina
Mortífera, como lazer, sem preocupação de usar a obra de
arte para interpretar a realidade.
A pirataria a que foi submetido o filme talvez tenha sido uma estratégia
de marketing de seus produtores, ou de garantir a sua exibição,
cuja produção foi cercada de muito mistério, já
que denunciava falcatruas dentro da corporação.
A esquerda inicialmente negou o filme. Vários críticos o classificaram
apenas como violento, bestializando as platéias. Concluíram que,
mesmo bem intencionada, a construção do filme aplaudia a truculência
policial e os atentados aos direitos humanos. Uma rejeição infantil,
como se bastasse ser da esquerda para estar certo. Reserva de mercado ideológico.
A crítica às ONGs que atuam nas favelas, a história das
passeatas em favor da paz, como se o policial quisesse a guerra, irritou a classe
média, que anda meio perdida ultimamente. Devíamos mesmo era abraçar
de vez a luta pela legalização do tráfico. O valor do filme
está em seu conteúdo, não é um renovador de linguagem.
Ele foi um soco na boca do estômago, nauseante. Quem esperava uma versão
cult da violência, tradução artística, teve que suportá-la,
sem qualquer eufemismo. O realismo de muitas cenas leva ao enjôo e à
irritação.
Tropa de Elite deu a sua versão. Por que não ouvi-lo? A polícia
talvez não esteja certa, mas não está completamente errada.
A verdade não está de um lado só. Negar o filme é
uma forma estúpida de não enfrentar o problema.
José Padilha, infelizmente, sofre o patrulhamento ideológico da
esquerda e a perseguição da cúpula da polícia que,
com o filme, ficou com as calças nas mãos. Isso demonstra que
o diretor fez uma obra polifônica, abrigando várias vozes.
O Tropa de Elite deu uma aula de realidade. Infelizmente, nós, de classe
média, somos muito moralistas, gostamos de apontar erros nos outros,
mas somos incapazes de fazer a autocrítica.
Meus alunos, educados a ver cinema hollywoodiano, aderiram ao Capitão
Nascimento e a seus métodos. Platéias que vibram com assassinatos
e torturas nos deixam horrorizados, mas também a cegueira de intelectuais
de barzinhos não constrói nada.Tropa de Elite demonstra que a
ética depende da situação, ninguém é bom
ou ruim em qualquer contexto. O filme não caiu no maniqueísmo
barato de bandido e mocinho, por isso é muito bom.
(29.10.07)
Elite da Tropa
Autor: André Batista, Rodrigo Pimentel, Luís Eduardo Soares
Editora Objetiva
312 páginas
2006
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