A Garganta da Serpente

Zoe de Camaris

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SCORPIO

"Quem ensinasse os homens a morrer, os ensinaria a viver."
Montaigne

Nigérrimo lacrau, vermelho sangue. Veneno hipnótico, arma de guerra, malho de cabo curto, correia de ponta metálica, metálico aço, mentiras em forma de dardos, aguilhão, picada letal, azorrague. Carnívoro escorpião, de que hostes primitivas vieste? Em que hora Pandora criou em sonho mimese de tão sutil realidade? Antares, Coração do Escorpião ferindo o firmamento, confunde-me seu brilho baço, seu céu fixo, sua estrela reflexa em minha testa lua minguante, o pântano e o silêncio ameaçador da noite. Esconde-se entre os miosótis, aracne que nada tece, ao espreitar calada minhas marcas sob a pele, sobre o vasto. Que aquele que anda nas águas, filho de Poseidon e preferido de Ártemis, grande caçador feras, aplaque a sede a febre, o grito lancinante e que me escurece a vista, abraça-me forte. Sou Aurora que reflete o sol, a dos róseos dedos, de tanta delicadeza. E alucino. Esconde-te de mim? O que quer Afrodite, lançando-me o gigante? Quero padecer em dissolução estelar, doce entropia, siderada. Em meio ao sono, o seu rastejar sobre o seio esquerdo, lento e preciso, o ferrão penetrando o sexo, tímido corte. Frio, gelado pesadelo:
- quero que me mates, quero as dores do poente, os cemitérios do mar do norte. E no entanto, nunca houve mais vida, ah, leva-me contigo para o reino daquela que não se pronuncia o nome e deixa-me nessa eternidade, pois não saberei mais viver sem ti, mal encarnado, sem ti, patas e mandíbulas, sem ti, sem ti, íntima umidade. Serei seu basilisco, antídoto e geração, de olhos paralisantes. Basilikon dilacerada sob a pedra, bálsamo real. Fecho os olhos solares, abro a calada noite. E a Fênix, resplandece, soberana águia que o mundo quis forte, saída dos abismos, do símbolo incontestável da morte.


(Zoe de Camaris)


voltar última atualização: 30/06/2003
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