POEMA EM PLENO VÔO
Em Recife,
às quatro horas da tarde
do alto do apartamento
tinha um papel pequeno e solto
contendo um poema.
Ventava muito ali na varanda
mas o poema não poderia está mais bem protegido
debaixo do livro do Carlos Drummond de Andrade.
De repente, tomei do livro
e me esqueci do poema.
Revoltado, talvez,
tomado pelo complexo de inferioridade, certamente
o poema aproveitou a carona do vento e voou.
Teria perdido o poema para sempre,
pensei.
Atônito já não me lembrava das palavras
que voavam, agora, para longe.
Impávido, acompanhava as parábolas do poema,
no
ar
sobrevoando a copa da árvore,
se recusando a pousar.
Uma moça que passava
tentou tomar o poema em suas mãos,
mas o vento o levou para ainda mais longe.
E ela me sorriu como a dizer:
- Teu melhor poema fugiu, poeta.
De minha sacada
restava apenas constatar
que as palavras se dissolviam
no
balé do ar.
Ia longe o poema:
perdendo-se de mim
para ganhar a rua,
o bairro, a cidade
e o olhar de um homem
que jamais o vai ter,
mas o vê, distante,
comovido.
(Weliton Carvalho)
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