QUISERA
Não foi de todo em vão a minha estada no planeta.
Percorri, célere, os meus próprios caminhos
E se despenquei em despenhadeiros e culpas
a culpa
Foi dos instantes, que, estes sim, despencavam.
Sonhei sonhos dourados de realização e glória
E se não os aproveitei inteiramente
foi por minha própria incompetência.
Mas quisera mais.
Quisera não ver dispersos todos esses sonhos,
Quisera estar a quatro mãos compondo músicas e
Ouvindo poesias,
Não ter que ouvir, ao ligar o rádio,
Todas essas invasões de privacidade,
De favelas, de países e não ter que chorar
Por todos os Iraques e Biafras.
Quisera estar em sintonia com as baleias que encalhassem
Em todos os litorais; e não medir esforços para devolvê-las
Ao mar (e à vida) e gravar-lhes todos os sons,
Suas falas, suas formas de comunicação,
E entender-lhes os lamentos agônicos
E os sorrisos alegres de mamíferos pacíficos.
Quisera ter acreditado mais em mim
E espalhado mais sorrisos e esperanças e me tornado
Grande lembrança aos que me tocassem
E que me tocaram.
Quisera não ter despertado ódio (nem repulsa).
E me sentir alegre com olhares de amizades realmente amigas.
Quisera ter trabalhado também, como sempre o fizera.
Trabalhar sim, e muito.
Mas me fartar à larga com as alegrias do reencontro.
E me sentir repleto de verão e danças (nas grandes chuvas)
E não temer tempestades.
Quisera colher os frutos que o outono me presenteasse.
E não me sentir completo enquanto
Perdurasse a minha procura,
Enquanto não me aventurasse pelos bosques mais simples que encontrasse
Para descobrir aí o significado e a utilidade de ser árvore.
E lançar raízes no terreno fértil dos corações.
E tirar vida nova desse novo chão.
(Vicente Siqueira)
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