Variações
(em tom menor, é claro)
sobre a poesia de Eduardo Bettencourt Pinto
1. Percorro os nomes e os
lugares
destes versos. Da geografia
sei muito pouco: os retratos em que nos perdemos
da infância e dos cheiros da terra,
o vagar do tempo, as suas rugas
na face da página, a breve crispação
das folhas sobre o sul.
Há três sílabas perdidas
na malha de um mapa tão esquivo assim:
talvez An seja a mais doce
e Go a mais magoada,
mais leve La como fosse
sílaba em que se ouvisse
o rumor dos deuses e a sua ausência.
2. Crescem os deuses
do chão, na luz do sul recortam
um perfil de frutos e de flautas. Rente
às ervas altas leio o rasto dessa música
solar, as amansadas feras
à beira dos desertos e da sua claridade.
E quando a memória queimar demais, chamarei
a mim a sombra das figueiras bravas. Sem figos
como nos rebenta a boca ? Olho as ruínas,
os escombros da cal e acolho um pássaro
de melancolia
vindo da névoa e de um ardido setembro.
3. Regresso dos nomes e lugares
destes versos. Não direi, porém,
a exacta dimensão em que me tenha
perdido ou encontrado.
Pouso no peitoril a túnica
das palavras, o secreto sal dos seus caminhos,
e escuto
a lenta respiração
do mundo.
(Urbano Bettencourt)
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