A Garganta da Serpente

Ubirajara Sá

  • aumentar a fonte
  • diminuir a fonte
  • versão para impressão
  • recomende esta página

Passageiros misteriosos

Sentado em um banco do corredor
Cheio, sem lugar onde por os pés
Sem meios de não roçar e sentir dor
O passageiro, descontraído, através
Do ombro, sentiu o roçar das pernas
Macias, que lhes rompiam as forças internas.

De soslaio, mas eufórico
Uma agonia muscular o estremecia
Acanhado e calórico
Penetrava em si uma sublime rebeldia
Algo estranho o tomava
Dissimulado, fez-se que sonhava.

Pernas grossas... xota generosa...
Mais rente, mais contente
Quente as coxas o comprimiam, gostosas
E mexia, e se mexia, e se fazia presente
E ele mudo, desnudo se via
E ela roxa, com as coxas, o espremia.

Avermelhada a face da senhora, moça...
Louca de uma manhã de verão
Quando o sol nasce mais cedo e faz troça
Um caminhão que atropela um pobre cidadão
Uma senhora que brinca de gozar, do jeito
Que gosta, como não encontra no leito...

Um sábio oportunista, anarquista indefeso
Peso pesado da putaria, mas tímido
Sua reputação de investidas é um peso
Que carrega consigo desde menino tísico
Cresceu, desgovernou-se, mas não se instalou
Cabisbaixo, às vezes um macho que não amou...

A condução esvaziara; e com ele os assentos
Lento, lentamente os olhares se viram
Riram-se, e a bela madona, com gestos lentos
Ao seu lado descansou; e suas mãos sentiram
Um pulsar de um membro fogoso
Pois, a madama astuta, já o havia tornado furioso.

E assim, depois de tanta putaria,
Depois de gozar por uma punheta sem compromisso;
Ninguém viu, mas, também, ver não adiantaria,
Pois ninguém tinha nada com isso!
Ele... saltou sem se voltar para trás, no ponto habitual
E ela, sem o olhar, seguiu sem lhe fazer nenhum sinal.

(Salvador, 12 de fevereiro de 2010)


(Ubirajara Sá)


voltar última atualização: 03/08/2010
9924 visitas desde 30/12/2009

Poemas deste autor:

Copyright © 1999-2020 - A Garganta da Serpente