A Garganta da Serpente

Rose Gusili

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TERRA

Viu um anjo carmim
a terra, o caminho,
um mundo sem fim,
quis saber nordestino.

Viu paisagem, viu trilha,
o pé que bem pisa,
o piso que brilha,
rachado e sem vida.

Viu semente carente
de água, de chuva,
seu enterro nascente,
viu a praga, a saúva.

Viu mato que é seco,
a seca que mata,
o verde em preto,
o fogo na mata.

Viu o poço de lama
do pobre à míngua,
o poço que clama
da pobre caatinga.

Viu fazenda rapina,
lavrador carcomido,
coronel que enrica,
viu o pobre caído.

Viu a roça que grita,
insolação malquerente,
viu essa gente desdita
se tornando descrente.

Viu famílias que rezam,
viu josé, viu maria,
que pelo céu se retesam,
em eterna agonia.

Viu a terra que enterra
o sonho dos pais,
que ficou lá na serra
e não volta, não mais.

Viu o pó, a poeira,
viu a filha que sai
de rebento de beira,
já viúva do pai.

Viu a terra de guerra,
viu o homem tenaz
que tenta e berra
e não desiste jamais,

viu a seca que erra
o alvo, o audaz,
pois nele se encerra
um grito de paz.

Quando o anjo carmim,
viu a terra, o caminho,
coisa seca sem fim,
chorou de mansinho.


(Rose Gusili)


voltar última atualização: 27/09/2010
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