DIÁRIO DE UM LOUCO
SEGUNDA-FEIRA: Hoje tudo aqui está quieto. As sombras que mostravam-me
a língua na parede fizeram um trato com a lua e viraram brancura de nuvem
indo duelar com o sol na tarde, que arde, lá fora. Estou além
do meu silêncio, e meu torpor é vago. Se eu comer banana sei que
me engasgo.
TERÇA-FEIRA: As grades crescerem à frente de meu nariz, e ouvi
barulho de muitos pés correndo de encontro ao portão. Até
Napoleão que era bom na parte de guerra, nessa cela, vira rato de porão.
QUARTA-FEIRA: Hoje a vaga lembrança da moça de trança veio
me visitar. Eu desci do topo da escada onde estava crucificado pelos estragos
das manhãs, que eu quis alcançar. Senti arrepios do canto vazio;
sem sentir, fui parir porqueiras de ir e canseiras de vir, ao lado de tudo que
restou de mim.
QUINTA-FEIRA: Dia comprido, vazado, simétrico compassado. Dia fugaz como
eu. Hoje amanheci Deus.
SEXTA-FEIRA: Um cheiro de mato queimado inunda o meu ser. Não posso esquecer,
não lembro de tanto que tento sonhar em outro lugar. Aqui estão
meus restos vivos. Sei que daqui a pouco...não ligo
Meu cruel carrasco virá me buscar.
SÁBADO: Levaram-me ao topo de minha anarquia. O sol lá em cima
escancarado ria. Meu dorso está nu; não sou daqui sou do sul;
sou do mar, sou de vidro. Olho estranhezas no perdido amigo, que como eu mergulhou
no túnel, e tornou-se híbrido. A comida está crua e vomito
hidrofobia. Olho Tiradente na soleira da porta e sinto vontade de enforcar sua
alma torta. As luzes se apagam e acende em mim a histeria.
DOMINGO: Um forte odor de alma lavada recende o salão de bancos vazios.
Com caratonhas de medos, desfilam maquinados, fantoches de enredos, que estendem
a mão: Ah sim como vai? Não vou... fico então parado de
costas medindo o desvio com o olhar de quem viu e não parou pra atender.
Sou eu ou sou você? Quem são os dementes? Hoje é o ontem
do amanhã, que foi rente, seguro varreu o velho da folha presente...morreu
o dia de novo, fico só, então, resolvo virar corvo.
(Rose Arouck)
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