Nós
Não nascemos irmãos,
nos fazemos irmãos
num duro aprendizado
de renúncia, desprendimento.
No sangue trazemos só
uma tímida vocação para o outro
que lançada na correta estação
e cultivada no justo procedimento
das lavouras sensíveis
dá sua flor, seu fruto exuberante.
Não nascemos solidários.
A mão estendida, o gesto fraterno
não pertencem à seqüência natural
de movimentos de nossa complexa arquitetura.
O que existe em nós é uma possibilidade,
uma seta que aponta o caminho íngreme.
Enxergar o outro, sair de si,
fazer sua a dor do outro,
atos que por vezes
nos é difícil admirar,
que dizer de neles nos aventurarmos,
ou deles fazer nosso propósito.
Forte e raro é o que se doa, o que abdica.
O bom é raro,
tanto mais raro quanto melhor.
(Radamés Manosso)
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